Sugestão de punição da CBF por atos racistas sofre resistência de clubes
A sugestão da CBF de punir com a perda de pontos os clubes cujos torcedores praticarem atos de cunho racista ou discriminatório nos estádios sofre resistência dos principais dirigentes do futebol brasileiro. Antes de levar a ideia ao Conselho Técnico para debate, o presidente da entidade, Ednaldo Rodrigues, já recebeu com ressalvas a decisão por parte de alguns dirigentes.
Clubes como Flamengo, Palmeiras e Atlético-MG não declararam apoio claro à punição. Defendem pena inicial aos indivíduos que praticarem os atos, assim como Inter e Fortaleza. Dos presentes no Seminário de Combate ao Racismo e à Violência no Futebol realizado nesta quarta-feira na CBF, apenas Vasco e Bahia foram favoráveis às sanções esportivas. Outros clubes sequer compareceram. A Conmebol, através do presidente Alejandro Dominguez, apoiou a causa, mas revelou apenas aumento de multa para casos assim no continente, sem perda de pontos em seus torneios.
— Não seria tirar o ponto de forma aleatória. Mas com provas. A multa apenas não tem inibido o racismo. O clube paga e na semana seguinte vem outra multa. Essa é a opinião da CBF. Vamos conviver com os que apoiam e os que não apoiam — afirmou o presidente Ednaldo Rodrigues.
A CBF criou um grupo permanente para o debate e o que for definido seguirá para o Congresso Nacional e o Superior Tribunal de Justiça Desportiva, uma vez que já há punição prevista no Código Brasileiro de Justiça Desportiva para os casos de injúria racial. Recentemente, o Senado aprovou projeto do senador Paulo Paim (PT-RS) que aumenta a pena de reclusão para dois a cinco anos. Mas ele está parado para análise da Câmara, que inicialmente pautou o tema.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, compareceu à CBF para dar peso político à discussão.
— Esse projeto propõe a qualificação da injúria racial quando cometida no estádio de futebol. Haverá obrigação do Estado de processar quem cometer o ato independentemente da denúncia da vítima. Além da lei e das penas maiores, a solução virá quando quem praticar tiver repressão do estado e da sociedade. Gerar esse constrangimento — defendeu Pacheco.
Até agora, isso não tem acontecido. Ao apresentar o Relatório Anual da Discriminação Racial no Futebol 2021, Marcelo Carvalho, fundador e diretor executivo do Observatório da Discriminação Racial no Futebol, divulgou um dado alarmante: os casos até agosto de 2022 no Brasil já igualaram os de 2021, 64 no total. Além do aumento gradual nos casos de racismo, que subiram de 31 para 64 entre 2020 e 2021, a edição deste ano traz ainda 24 situações de LGBTfobia, 15 de machismo e outras seis de xenofobia. Os dados correspondem ao período de 1˚ de janeiro a 31 de dezembro, e são levantados através de súmulas das partidas, reportagens e registros de Boletim de Ocorrência.
"Quando iniciamos a elaboração do relatório, lá em 2014, tinha-se a ideia de que o racismo no futebol brasileiro eram apenas casos isolados, não algo estrutural. De lá para cá, a gente consegue assegurar para a sociedade que não, os casos de racismo não são esporádicos e eles não são isolados, eles acontecem com muita frequência. Quando a gente traz os dados e os desdobramentos desses casos, a gente está mostrando, por exemplo, se houve punição ou não", disse Marcelo, que deu sua opinião sobre o aumento observado entre 2020 e 2021.
"Os números de 2021, eles estão muito parecidos com os números de 2019. A gente olha para 2020 e vai ver que a gente teve aquele momento de pandemia. Três meses sem futebol em estádios e oito meses sem torcida, mas quando o público volta para os estádios, os números voltam para aquele patamar alto que a gente tinha anteriormente", finalizou.
Dos 124 casos que envolvem o futebol; 74 dizem respeito à discriminação racial (soma total de casos ocorridos no Brasil, 64, e no exterior, 10); 25 envolvem LGBTfobia (soma total de casos ocorridos no Brasil, 24, e no exterior, 01); 15 machismo; 10 xenofobia (soma total de casos ocorridos no Brasil, seis, e no exterior, quatro). Dos 74 casos que dizem respeito à discriminação racial no futebol (64 Brasil +10 Exterior), em 48 deles as vítimas são atletas; em 03 as vítimas são árbitros; em 10 as vítimas são torcedores; em seis deles os prejudicados são funcionários dos estádios ou algum membro da comissão técnica dos clubes; em um caso a vítima foi um membro familiar do atleta; em dois as vítimas foram ex-atletas, em dois as vítimas foram integrantes da imprensa esportiva e em dois deles os ofendidos foram um jogador de e-sport e os modelos negros de uma campanha publicitária no lançamento de uniforme do clube.
Fonte: O GloboMais lidas
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