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Corre! Flamengo será último a ter categorias de base investigadas

Marjoriê Cristine e Raphael Zarko

Não é só o Vasco que tem problemas para cuidar das suas categorias de base entre os grandes do Rio. Com alto investimento na reforma de “Carandiru”, apelido antigo e pouco carinhoso do CT de Xerém, o local ganhou melhorias para os garotos tricolores. O Botafogo, desde 2009, fez reformas importantes, assim como o Flamengo mostra avanços no Ninho do Urubu. Mas o Ministério Público não abre mão da uniformização para todos os clube do Termo de Ajustamento de Conduta que o Vasco está há mais de um ano para assinar. Há falhas quanto a cuidados médicos, garantia de convivência com familiares e acolhimento dos meninos de outros estados.

- Percebemos que os outros clubes se apavoraram com o que aconteceu no Vasco (a morte do menino Wendel). Assustou até patrocinadores, porque prejudica a imagem. Quando fomos ao Fluminense e ao Botafogo, vimos que já esperavam nossa visita - lembrou Afonso Henrique, promotor do MP-RJ.

O TAC, que está sendo cobrado de todos os clubes, pede como parâmetro de acolhimento em divisões de bases o mínimo também solicitado em abrigos para “crianças em risco” - que vivem na rua, abandonadas pela família ou violentadas sexualmente -, conforme determinação do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e Adolescente e do Conselho Nacional de Assistência Social.

Em Marechal Hermes, um único quarto abriga cerca de 20 garotos e tem capacidade para até 30. Na “cartilha” elaborada pelo MP, o ideal são quatro meninos por quarto e, no caso de lotação máxima, seis. O cômodo deve ter também armário e guarda-roupa individual e metragem mínima de 2,25 metros quadrados por ocupante. No Ninho do Urubu, os jovens atletas não contam armário apropriado do clube para guardar roupas.

Faltam a dirigentes e advogados dos clubes os conhecimentos básicos do que pede o Estatuto da Criança e do Adolescente e a Lei Pelé. Cada time precisa garantir não só “alojamento e instalações esportivas adequados, sobretudo em matéria de alimentação, higiene, segurança e salubridade”, como também educação, transporte e convivência familiar. Conviver com a família, no caso, significa custear viagens ou do jovem atleta para reencontrar seus parentes ou dos parentes para visitarem o menino.

- Os clubes dizem: “Mas onde está escrito isso?” - lembra um dos promotores responsáveis pelas visitas.

De fato, a legislação não é clara a respeito da obrigação do clube de pagar viagens para a família, mas o MP quer assegurar isso através do TAC. Nas conversas com os meninos, ouviu queixas de saudade dos familiares e outros tipos de reclamação.

- Um menino nos contou que não tinha sequer um momento de privacidade na vida. Dormia, acordava e fazia refeições ao lado de 20 pessoas. Na hora do banho, também não havia divisória. Precisamos lembrar que eles não estão confinados. Eles vivem ali, é a casa deles - lembrou Afonso Henrique.

Com fama de bagunçado, Flamengo será deixado por último


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O garoto Ary Rian, que se machucou em treino no Ninho do Urubu, em março Foto: Thiago Freitas



Depois do goleiro Ary Rian, de 14 anos, levar 33 pontos na perna, o MP registra outros casos que merecem cuidados no Flamengo. No Ninho do Urubu - que ainda passa por obras -, um jovem atleta com anemia falciforme não poderia jogar futebol. Garotos que precisam acordar às 4h30, esperam ônibus para ir à Gávea e que, se à noite perdem a condução da volta do colégio, ficam na casa de amigos ou até mesmo pela rua. Os relatórios do MP ainda observam que não há acompanhamento da escolaridade dos jovens atletas.

- São pouquíssimos os que vão seguir a carreira no futebol. Qualquer desligamento, ainda mais com essa idade, causa um trauma. Só há psicologia esportiva. Querem saber apenas o que aconteceu para errar um pênalti - lembra outro promotor, que cita também a falta de controle das fichas médicas dos atletas, que fica na Gávea, enquanto eles treinam e moram no Ninho do Urubu.

- O garoto que tinha anemia falciforme não tinha alimentação diferenciada. Se precisar de reforço, de uma vitamina a mais, não acontece - disse um promotor, que não quis se identificar.

Fluminense e Botafogo, em melhores condições, devem se reunir com o MP. O Fla será deixado por último. Para todos, está sendo feito um inquérito civil público.

- Pelo perfil do Flamengo, de muita confusão, já no profissional, de tudo que a gente acaba sabendo, preferimos deixar por último - disse o promotor.

Fonte: Blog Jogo Extra