Imprensa

Sport x Vasco: Duelo de literatos

Ariano Suassuna, torcedor ferrenho do Sport, e Sérgio Cabral, vascaíno desde o nascimento, são dois gigantes da literatura brasileira que têm o amor pela escrita como ponto em comum. Mas hoje estarão em posições opostas, tudo em nome da paixão que têm por seus clubes.

O confronto entre Sport e Vasco hoje, às 21h50min, na Ilha do Retiro, é cercado de expectativas. A ginga do drible, a beleza do gol ou a virada dramática povoa a mente dos torcedores e faz parte do futebol, arte inerente à cultura brasileira. Não por acaso, craques do mais alto gabarito da literatura nacional estarão frente a frente.

Ariano Suassuna, escritor e torcedor do Sport, está de um lado. Sérgio Cabral, escritor e jornalista, vascaíno roxo, do outro. O gosto de ambos se une no amor pela cultura popular brasileira.

Ironicamente, um dos ícones desta arte, o futebol, os separa antes do jogão de hoje.

– Tive simpatia pelo Vasco por conta de jogadores do Sport que lá estiveram. Mas antes desse jogo aí, quero ver a cara do Diabo, mas não quero ver a do Vasco – diz Ariano Suassuna.

A simpatia entre os clubes citada pelo escritor paraibano encontra reflexo em Sérgio Cabral.

No Vasco, pernambucanos como Ademir Menezes e Vavá fizeram sucesso. E contam até hoje com o agradecimento de Cabral, que também reverencia Ariano.

– Tenho carinho pelo Sport principalmente porque é o clube do Ariano. Vasco e Sport são parecidos. Até o grito de “Casaca!” eles fazem – analisa Cabral.

Sobre o confronto de hoje, o vascaíno aposta suas fichas nos garotos e na dupla formada por Leandro Amaral e Edmundo.

– Mas ainda falta um Bellini na defesa – brinca Sérgio Cabral.

Morador da capital pernambucana, Ariano Suassuna espera para ver se irá à Ilha do Retiro.

– Vou decidir na hora para ver se o coração agüenta! – bradou.

Dentro de campo, o confronto terá início hoje. Fora, o bate-papo de Suassuna e Cabral já se tornou histórico. Literalmente.

– Minha paixão começou antes mesmo de ver o Sport jogar – diz Ariano Suassuna, sentado em uma cadeira de sua casa, em Recife.

Esta é a explicação do escritor para sua afinidade com oRubro-Negro pernambucano. Isto porque, quando o ainda menino Ariano morava no sertão da Paraíba, seu irmão mais velho, Marcos, brilhava no basquete do Sport, em Recife. De tanto ouvir histórias sobre o Leão da Ilha, Suassuna se viu torcedor do Sport, a quem só assistiu pessoalmente pela primeira vez em 1937.

FUTEBOL E ARTE
“Além da literatura, tenho interesse por diversas outras artes. Inclusive pela música e pela dança. E da forma como se joga o futebol, me passa essa ligação da arte do espetáculo com a dança. Eu vi o brilhante Garrincha jogar e ele jogava como quem dança. Isso é importante para a cultura em geral. Não sei como o escritor brasileiro não tem interesse no futebol brasileiro. Acho que o escritor brasileiro que vê o Robinho jogar ganha muito.”

RELAÇÃO VASCO E SPORT
”Num dos anos em que o Sport esteve muito bem, fez uma excursão pelo Sul e os melhores jogadores foram contratados pelo Vasco. Ademir Menezes, que era extraordinário, foi para lá. Eu acompanhei sua carreira toda. Outro dia fizeram um programa sobre o Sport e cada torcedor dava sua opinião sobre qual era o maior time de todos os tempos. E todos se esqueceram de Ademir. Foi melancólico, não pode.”

PAIXÃO PELO LEÃO DA ILHA
”O fato de o Romário ter feito o milésimo gol no Sport, pouco me importa. Para mim, o Sport é o maior do mundo. É tudo. Tem 37 campeonatos estaduais. Eu já disse isso e repito: se um dia São Pedro quiser fazer um contrato comigo e disser que o Sport vai descer para a terceira ou quarta divisão do Brasil, mas que ganharia o campeonato de Pernambuco sempre, eu assinaria embaixo na hora.”

GRANDE ÍDOLO
”Tenho muita saudade e falta do Vavá. Foi campeão de 58 pela Seleção e marcou gol na final. Esse era um leão, um verdadeiro jogador do Sport. Se o gol estivesse ali e houvesse uma foice antes, ele metia o pé.”

“Vascaíno porque o destino quis.” Esta é a afirmação do jornalista e escritor Sérgio Cabral sobre o Vasco, seu clube do coração. Além do otimismo para o confronto contra o Sport, ele relembra os tempos do Expresso da Vitória e a admiração pelo escritor Ariano Suassuna, seu “adversário” de hoje.

POR QUE VIROU VASCAÍNO
“Foi pelo motivo mais simples. Estava em dúvida se eu seria Botafogo ou América. Mas houve um jogo entre Vasco e Botafogo, o Vasco venceu e o destino decidiu para mim.”

A PRIMEIRA LEMBRANÇA
“Eu me lembro de um jogo Vasco x São Cristóvão e o time vascaíno venceu por 7 a 1. Já era o Expresso da Vitória, tinha certeza de que venceriam, mas o placar me marcou a ponto de não esquecê-lo até hoje.”

MAIOR ÍDOLO
“Bom, meu ídolo até hoje é o Ademir Marques de Menezes, o Queixada. Ele, inclusive, também foi jogador do Sport. Aliás, eu sou muito grato ao Sport, porque eles passaram para o Vasco três dos meus maiores ídolos: Ademir, Almir Pernambuquinho e Juninho Pernambucano.”

INFLUÊNCIA DO FUTEBOL
“Eu tinha um projeto de escrever a biografia do Ademir Marques de Menezes. Eu, inclusive, cheguei a falar com ele diversas vezes sobre isso, mas o Fernando Horácio, um grande jornalista esportivo, me disse que estava escrevendo e, aí, eu tirei o meu time de campo. Só que ele acabou não escrevendo. O Ademir morreu, o Horácio também, e agora não dá nem para reclamar dele (risos).”

FUTEBOL NA LITERATURA
“A realidade do futebol é mais surpreendente do que a ficção. Veja o exemplo do Flamengo. Quem diria que eles seriam eliminados pelo América mexicano? Se alguém fosse escrever sobre futebol, a ficção iria ficar aquém da realidade.”

O QUE O VASCO REPRESENTA
“Na sociedade, a luta contra o racismo e o preconceito. No campo, o título do Campeonato Sul-Americano de 1948, marcante para o nosso futebol. Foi o primeiro título de um clube brasileiro no exterior.”

Quem é

Nome: Ariano Vilar Suassuna
Nascimento: 16/10/1927, em João Pessoa (PB)
Profissão: Escritor, dramaturgo e atualmente é Secretário de Cultura de Pernambuco.
Algumas obras: “ O Auto da Compadecida” e “O Romance d\"A Pedra do Reino”.
Curiosidade É membro da Academia Brasileira de Letras.

Quem é

Nome: Sérgio Cabral Santos
Nascimento: 27/5/1937, no Rio de Janeiro (RJ)
Profissão: Jornalista, escritor e crítico de música.
Algumas obras: “Pixinguinha, Vida e Obra” e “As Escolas de Samba – o que, quem, onde, como, quando e porquê”
Curiosidade: Já foi vereador no Rio e é pai do governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral Filho.

Fonte: Lance