Futebol

Hoje técnico em Rondônia, ex-vascaíno Paulo Miranda diz que sofreu racismo

Nos tempos do Vasco de Romário, Juninho Paulista, Juninho Pernambucano, tinha também Paulo Miranda. Era ele quem garantia lá atrás a tranquilidade para os homens de frente barbarizarem as zagas adversárias. Foi assim na final da Copa Mercosul de 2000, numa virada histórica sobre o Palmeiras, em pleno Parque Antarctica, quando o time venceu por 4 a 3 após uma desvantagem de 3 a 0 no placar. Hoje treinador do Genus, de Porto Velho, da primeira divisão do Campeonato Rondoniense, eliminado da competição neste sábado, pelo Vilhena, relembra os bons e maus momentos na carreira, como o preconceito racial vivido na Europa, quando atuava pelo Bordeaux (2000). Sim, Paulo Miranda foi chamado de macaco muito tempo antes de Daniel Alves e outros jogadores brasileiros.

- Na época, éramos eu e mais dois jogadores negros que são meus amigos, jogando contra o Valencia, da Espanha. Na ocasião, os torcedores imitavam macaco quando pegávamos na bola, mas isso só fez com que jogássemos muito mais. Mas tenho certeza de que um dia isso vai acabar - afirmou Paulo Miranda, mais um a fazer foto com banana nesta semana, em campanha contra o racismo.
Paulo Miranda, Vasco (Foto: Arquivo Pessoal)Paulo Miranda, Vasco (Foto: Arquivo Pessoal)

Natural de Curitiba, Paulo Miranda jogou por outros grandes clubes brasileiros, como o Paraná, Atlético-PR, Cruzeiro, Flamengo e São Caetano, além do Bordeaux. Mas foi pelo Vasco que o volante, às vezes lateral-direito, se destacou. Em São Januário, faturou o Campeonato Brasileiro (2000), a Mercosul (2000), o Torneio Rio-São Paulo (1999) e o Campeonato Carioca (1998).

- A minha trajetória no Vasco foi emocionante. Eu saí do Atlético Paranaense e fui para o time com um sonho de jogar ao lado de atletas como Romário, Edmundo, Viola, Juninho Paulista, Luizão, entre outros. Muitos deles jogaram a Copa do Mundo em 1994 e quatro anos depois eu estava no meio dessas feras aí. Era um time muito forte, o clube a ser batido. Eu me apaixonei pela equipe e tenho uma história de muito carinho pelo clube.

Um dos momentos mais marcantes de sua passagem pelo Vasco foi na final contra o Palmeiras, pela Copa Mercosul, em que o Gigante da Colina ganhou de virada por 4 a 3, depois de terminar o primeiro tempo perdendo por 3 a 0.

- Aquela equipe do Vasco realmente marcou toda uma geração, marcou época. No jogo contra o Palmeiras, estávamos perdendo de 3 a 0 e conseguimos virar para 4 a 3, o que tornou aquele jogo inesquecível. É um dos jogos mais emocionantes da história - lembrou.

Por todas essas conquistas pelo time carioca, Paulo Miranda recebeu grande homenagem da torcida cruz-maltina de Porto Velho. O agora treinador foi recepcionado pelos torcedores na Toca do Vasco, um bar exclusivo do time cruz-maltino, na capital rondoniense.

- Foi muito lindo receber essa homenagem e eu fico muito feliz. Falo hoje para os meus jogadores como treinador que não interessa onde você está, mas sim se a sua passagem vai marcar época.

Carreira como técnico

Paulo Miranda decidiu começar a carreira como treinador em junho do ano passado após um encontro com o técnico Abel Braga nos Estados Unidos. Paulo já havia trabalhado com Abel quando ainda era jogador.

- Encontrei o meu amigo Abel Braga, que estava com o Fluminense em Orlando, e com o Marcelo Oliveira, que também estava com o Cruzeiro. Tive a grande oportunidade de ver os treinamentos desses times. Fui anotando tudo e falei para mim mesmo: "Meus Deus... é o que eu gosto e é o que eu quero ser." A partir daí, decidi me especializar.

Paulo fez estágio com Abel Braga, conversou muito com Levir Culpi, hoje no Atlético Mineiro, e também terminou os seus estudos no Atlético-PR e no Internacional, de Porto Alegre, para depois iniciar a carreira de treinador no Oeste, time da terceira divisão de Santa Catarina, em junho de 2013.

- Cheguei a este clube e aprendi muito. Consegui levá-lo para a primeira colocação da competição no segundo turno, depois de um início bem difícil na primeira fase.

Racismo como treinador e jogador

Além de gostar da nova profissão como treinador, Paulo Miranda também quer diminuir uma triste estatística. O número de técnicos à frente das equipes brasileiras de futebol ainda é bem pequeno. Paulo se inspira nos treinadores americanos da NBA – liga americana profissional de basquete – para mudar essa realidade. Como jogador, sentiu na pele os efeitos do racismo jogando pelo Bordeaux, na antiga Copa da Uefa.

- Na época, éramos eu e mais dois jogadores negros que são meus amigos, jogando contra o Valencia, da Espanha. Na ocasião, os torcedores imitavam macaco quando pegávamos na bola, mas isso só fez com que jogássemos muito mais.
Paulo Miranda (Foto: Francisco Evaldo/Facebook)Paulo Miranda aderiu à campanha contra o racismo (Foto: Francisco Evaldo/Facebook)

Nesta semana, o atual treinador do Genus tirou uma foto em apoio à campanha contra o racismo, 'Somos Todos Macacos', iniciada por Neymar, depois do episódio vivido pelo lateral-direito da Seleção e do Barcelona, Daniel Alves, que comeu  banana atirada por um torcedor no jogo da equipe catalã contra o Villareal, partida válida pelo Campeonato Espanhol.

- Eu, como homem, tenho a certeza que isso um dia vai acabar. E tem realmente que acabar – enfatizou.

Parecido com Seedorf

Segundo Paulo Miranda, o primeiro a ressaltar a semelhança entre ele e o grande astro holandês foi o seu amigo, Rodrigo Ernesto, quando Seedorf ainda jogava pelo Milan, da Itália.

Por coincidência, Paulo Miranda e Seedorf, além de parecidos fisicamente, ainda se parecem em suas escolhas, pois o ex-jogador holandês também iniciou a sua carreira como treinador, após sair do Botafogo e voltar para a equipe rossonera, agora como comandante do grupo.

- Quando eu saía para passear no Rio de Janeiro, o torcedor comentava muito: é o Paulo Miranda ou o Seedorf? - brincou.

À frente do Genus

Como treinador do Genus desde a quarta rodada do Rondoniense, quando estreou com vitória, dia 15 de março, depois que assumiu a vaga do treinador Saturnino Neto, que foi demitido, Paulo Miranda se despediu da competição estadual neste sábado, depois de perder para o líder Vilhena jogando em casa, no estádio Aluízio Ferreira. O time precisava apenas de uma vitória simples para se classificar, mas não conseguiu. Paulo Miranda ainda não sabe qual será o seu futuro, mas já foi sondado por outro time de Rondônia.

Fonte: ge