Ex-goleiro do Vasco manda recado para Michel Alves
Quando viu a chegada de Michel Alves ao Vasco, Valdir Appel viajou no tempo. E parou no dia 16 de março de 1969, no Maracanã. Naquele tarde, o ex-goleiro do time de São Januário, hoje com 67 anos, fez contra o Bangu um lance quase idêntico ao de Michel, pelo Criciúma, na Série B do Brasileiro. Momentos depois de assistir a infelicidade do novo vascaíno, Valdir atendia ligações de todos cantos do país.
- Assistia de casa o jogo e, segundos depois, tive que responder: o seu foi igual a esse? Como se sentiu? - lembra o ex-jogador, que trabalha há 26 anos numa multinacional sueca.
Para amigos, Valdir chegou a brincar com o gosto do seu ex-clube por um goleiro que passou por experiência semelhante a dele. Mas elogiou a personalidade de Michel, que encarou a repercussão mundial do lance.
- O mais importante é como reagir nessa hora. Ele fez um campeonato excelente. Comigo não teve TV, não tinha internet. Se tivesse, mostraria que fiz um segundo tempo perfeito - conta ele, que compara os dois lances.
- O Michel perdia o jogo (a partida terminou 4 a 1 para o América-MG). Ele tenta sair rápido e, no automático, esquece da bola. No meu caso não tinha pressa. Tive todo o tempo do mundo. Mas escorrego no arremesso, a bola bate na trave e entra.
Frango? Para o ex-goleiro, apenas acidente de trabalho.
- Mas não tem jeito, ninguém nunca vai esquecer. Falo há mais de 40 anos sobre isso. Até hoje, onde chego, falam: esse é o Valdir, conhece? O do gol contra. Se eu puder dar um conselho para o Michel, é isso: tenha muita paciência e bom humor - pede Valdir, que lembra de um frango de verdade.
- Foi em São Januário, um jogo que ganhávamos de 2 a 0, a bola veio fraquinha, mal chegou no gol. E eu deixei passar por pura desconcentração. Lembro que minha reação foi de sorrir com a minha falha. O Brito (zagueiro do Vasco na época) olhou para mim, eu falei: vou fazer o quê? Chorar? Já aconteceu - afirma Valdir
Mas nem sempre Valdir levou o gol contra com bom humor assim. Na saída para o intervalo, em 1969, ele chega a xingar o repórter que questiona se ele voltaria para o jogo.
- Não, sua mãe que volta, filho da puta! - relatou o ex-goleiro num de seus dois livros sobre futebol.
Quase arqueiro do rei
Na infância, em Brusque, o pequeno Valdir ficou atrás do gol de Barbosa tentando alcançar as bolas que saíssem da meta do goleiro do Expresso da Vitória, que passava uns dias na cidade catarinense. Anos depois, Barbosa foi tentar consolar o jovem goleiro, de 23 anos.
- Naquela hora você não quer falar com ninguém, mas um radialista colocou o fone em mim e disse que era o Barbosa. Ele lembrou que passou coisa pior, porque foi na decisão de Copa. Depois, no fim do jogo, me deu um abraço e me incentivou a continuar a carreira - recorda.
O afago que recebeu de um dos maiores goleiros de todos os tempos do futebol brasileiro, porém, não foi suficiente para que Valdir perdesse a condição de titular. Após barrar o argentino Érrea, na época da seleção de seu país, o autor do gol contra foi para o banco com a chegada de um segundo goleiro hermano em São Januário. Mas esse fez história no clube. Andrada, que ficou marcado não por uma falha, mas por levar um gol de chute indefensável do melhor jogador de todos os tempos.
- Eu estava no banco naquele jogo do milésimo gol do Pelé. Poderia ser eu ali. Eu e Andrada já conversamos isso: depois da gente passaram vários goleiros também muito bons pelo Vasco, mas eu e ele sempre vamos ser lembrados - brinca Valdir, um contador de causos do futebol. Como um que narra sua passagem pelo América-RN. Num programa de TV, ele já havia falado ao mesmo entrevistador do gol contra, quando veio um novo pedido ao vivo, do mesmo lance.
- Você vê só! O Pelé fez 1.000 gols para ficar famoso. E eu só fiz um... - disse, em misto de humor e ironia.