Em 1951, torcida fez música para a Ademir e comemorou o título
Salve, salve rapaziada!!! A partir de hoje (1/8), assumo a coluna A Cultura do Futebol, substituindo o compententíssimo Claudio Lovato Filho. A honra pelo novo desafio é toda minha e, todas as quintas-feiras, levarei até vocês algumas curiosidades e dados interessantes que têm a ver com o lado fora do campo de futebol. Se esse esporte está tão entranhado no nosso dia-a-dia, nada mais justo do que tentar entender o porquê disso e mostrar o quanto as histórias da humanidade e do futebol se confundem.
Bom, como o título já entrega, falaremos hoje de gols tão famosos que viraram músicas. A lista não podia começar de outra maneira. Fio Maravilha, de Jorge Ben, é uma das mais famosas do cancioneio brasileiro. E retrata um verdadeiro gol de placa do folclórico atacante do Flamengo, em 15 de janeiro de 1972. Foi num torneio amistoso no Maracanã, contra o Benfica, de Portugal. Naquela altura, vitória rubro-negra pelo placar de 1 a 0, sendo o lance decisivo justamente o tento do atacante, que começou no banco.
Fio não primava por muita técnica e dele podia se esperar qualquer coisa: desde lances bem estranhos até belos gols. Uma espécie de Obina dos anos 70. Quando o placar estava em 0 a 0, naquele verão carioca, Zagallo lançou Fio em campo, a pedido da torcida. E aí, aos 33 minutos do segundo tempo, o camisa 14 Tabelou, driblou dois zagueiros / Deu um toque, driblou o goleiro / Só não entrou com bola e tudo porque teve humildade em gol. E a história estava escrita, assim como a música, sucesso do álbum Ben, do mesmo ano de 1972.
A próxima canção da nossa retrospectiva é Deixa Falar, sucesso da grande Carmen Miranda, lá em 1938. Àquela altura, Leônidas da Silva, do Flamengo, era a maior estrela do futebol brasileiro e Ary Barroso, o maior locutor esportivo da época, marcou presença na gravação da música, ao narrar um gol do Diamante Negro contra a Tchecoslováquia, pelas quartas de final da Copa do Mundo daquele ano. Ainda teve direito a soprada na característica gaita, após o anúncio de que o gol acontecera. Esta era uma marca registrada do locutor.
A canção fala sobre futebol, cita clubes cariocas e é uma crítica bem-humorada aos brasileiros que torceram contra a Seleção no Mundial (já existia isso na época
) Diz um trecho: Quando você dizia que trocava a gostosa feijoada pelo macarrão / Desconfiava que você não era brasileiro abençoado deste meu rincão / Você torcia pelo italiano, apostava-lhe o dinheiro e nem sequer me deu / Jogou a minha feijoada fora, falou mal da minha gente e ainda me bateu. O Brasil foi eliminado pela Itália, na semifinal daquele Mundial.
O grande Pixinguinha é outro que não podia ficar fora. Uma de suas composições mais conhecidas, Um a Zero, é uma bela homenagem ao futebol, mas o que pouca gente sabe é que se trata também de uma homenagem a uma partida em específico. Em 1919, o Brasil venceu o Uruguai pelo placar mínimo, na final do Campeonato Sul-Americano, e se tornou campeão continental pela primeira vez na História. O chorinho ganhou fama nacional, na carona da conquista, razão de comoção no país por muitos dias. O gol da vitória foi de Friedenreich.
A maior parte dos fãs da música lembra-se dessa canção como instrumental, mas a verdade é que há uma letra, muito embora o lance do gol de Friedenreich seja pouco específico: Numa jogada emocionante / O nosso time venceu por um a zero e a torcida vibrou. Aquela acabou se tornando a primeira das muitas conquistas do futebol brasileiro, que a partir dali só fez crescer e ganhou o mundo inteiro.
Em 1951, uma versão entrou para a história, mas também relatando um gol. O Vasco foi campeão carioca em cima do America, com gol do grande Ademir Menezes, o Queixada, na final. A torcida cruz-maltina, feliz da vida, cantou uma paródia da marcha Zum Zum, cantada por Dalva de Oliveira, grande sucesso do Carnaval do ano seguinte. A final do campeonato já aconteceu em janeiro de 1951, já que o campeonato de 50 acabou se estendendo muito, o que pode ter amplificado o sucesso da música, um mês depois, nos grandes bailes da época.
Oi zum-zum-zum zum-zum-zum-zum / Vasco dois a um / Ademir pegou a bola / E desapareceu / Osni tá procurando onde a bola se meteu, dizia a letra alterada do sucesso, inventada na hora, nas arquibancadas do Maracanã e cantada a plenos pulmões pela massa nas ruas, após o jogo. Osni, no caso, era o bom goleiro americano, incapaz de evitar a derrota diante do Expresso da Vitória. Na época, as marchinhas de carnaval e suas adaptações já eram comuns entre os torcedores. E Ademir acabou como artilheiro daquele ano, com 23 gols.
Outra das antigas fala sobre um não-gol do Flamengo. Em 2 de novembro de 1941, o Flamengo perdeu para o Botafogo em General Severiano, pelo Carioca, por 3 a 2. Wilson Batista, grande compositor da época, era rubro-negro fanático e se irritou com a derrota. No bonde de volta para casa, depois de uma calorenta tarde na Zona Sul, ameaçou não pagar a passagem, de tão irritado que estava. Virou-se para o amigo Antonio Almeida e desabafou: Tiro o domingo para descansar e vou ao futebol me aporrinhar. Assim nasceu a música.
Nandinho passa a Zizinho / Zizinho serve a Pirilo / Que preparou pra chutar / Aí o juiz apitou / O tempo regulamentar / Que azar!, diz um trecho. Historicamente, Nandinho só virou titular do Fla em 1942, mas talvez tenha sua inclusão na letra tenha sido uma manobra para que a métrica não se perdesse. Em 1941, o campeão foi o Fluminense, mas o Fla daria o troco e sairia o vencedor na temporada seguinte. Aliás, o título de 42 rendeu outra música: Coisas do Destino, cantada pelos próprios jogadores Nandinho, Pirilo e Vevé.
É claro que as torcidas cantam diversas versões homenageando gols e jogadores ao redor do Brasil, mas quando os compositores da música brasileira se reúnem para falar de futebol, sempre sai coisa boa. Prova disso é que há incontáveis canções que têm como tema central o futebol, até pela forte influência do esporte dentro da nossa cultura.
- SuperVasco