Comandante-geral da PM é vascaíno e espera dias melhores no clube
Nos bastidores ou na linha de frente todos foram importantes. Durante uma semana, o governo do Rio de Janeiro mobilizou esforços para conter a onda de ataques que espalhou medo no estado. O último balanço da Polícia Militar, divulgado nesta segunda (29), contava 37 mortos na guerra entre policiais e bandidos. O G1 destacou quatro profissionais que tiveram papel importante nas decisões dos últimos dias. De certa forma, eles representam os 2,7 mil policiais militares, federais, civis, e agentes do Exército e da Marinha que participam das incursões nos morros cariocas.
O gaúcho José Mariano Beltrame, secretário da Segurança Pública do Rio desde 2007, foi categórico: o Alemão era o coração do mal. A afirmação, dita em uma coletiva de imprensa no domingo (28), resumiu o sentimento do governo fluminense em relação ao conjunto de favelas do Alemão, na Penha, Zona Norte do Rio. Durante os dias de ataques constantes pelo menos 102 veículos foram queimados e cabines da polícia foram metralhadas Beltrame mostrou firmeza e afirmou que a polícia não iria ceder. Por concentrar grande quantidade de traficantes, o Alemão foi o principal alvo. E a polícia deve ficar na área por tempo indeterminado.
\"Marginal sem casa, marginal sem arma, marginal sem território, marginal sem moeda de troca é muito menos marginal do que era antes\", disse ele, na entrevista, horas depois da invasão das tropas no Alemão, nas primeiras horas do domingo. O governo chegou a dar um prazo o pôr-do-sol de sábado (27) para que os criminosos se rendessem, o que não ocorreu. A decisão de tomar o território em uma das áreas mais perigosas da capital passou por Beltrame.
\"O objetivo é obter território. E acabou a crença da invencibilidade. O Rio de Janeiro tem uma luta contra o crime que é composta de várias batalhas. Não vencemos a guerra, mas vencemos a mais importante e difícil batalha, afirmou o secretário, que é formado em direito pela Universidade Federal de Santa Maria (RS), em Administração de Empresas e Administração Pública pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Além disso, entre outras funções, foi chefe do Serviço de Inteligência na Superintendência da Polícia Federal do Rio e da Interpol.
Também peça-chave nas articulações para a operação na Penha, o comandante-geral da Polícia Militar, coronel Mário Sérgio de Brito Duarte, deixou de lado nos últimos dias a leitura, a música e o sono. Tenho dormido no máximo quatro horas por noite, quando durmo. Mas este sacrifício pessoal é de todos os policiais militares do Rio de Janeiro neste momento, disse em entrevista por e-mail nesta segunda. De acordo com ele, o cansaço passa. A história fica.
Bacharel em filosofia, disse ser um estudioso do espiritismo, é roqueiro assumido e tem entre suas bandas favoritas o Deep Purple. Para Duarte, que está na polícia há 31 anos e já comandou o Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope), a temida tropa de elite da PM, o momento mais difícil da operação no Alemão foi sem dúvida as horas da madrugada de sábado (...). Ali sabíamos o quanto estava em jogo e já tínhamos passado horas ouvindo da população em volta das nossas instalações operacionais o quanto eles queriam a operação.
Vascaíno e esperançoso de dias melhores para seu time, o coronel contou que, se pudesse, gostaria de apertar a mão de cada comandado, e de cada militar e civil que integrou a operação.
O botafoguense Rodrigo Oliveira, atual subchefe da Polícia Civil, não costuma dar ordens só do gabinete. Meu negócio é a adrenalina das ruas, assumiu. De farda e arma na mão, ele atuou diretamente nas operações no Alemão. Disse que só teve a real noção do que estava acontecendo nas favelas depois. Do lado de dentro, não tem como ter noção do que está acontecendo. Só fui ter a dimensão ontem (domingo), quando pude descansar um pouco, ver a repercussão da nossa ação entre a população, disse Oliveira, que tem 39 anos.
Com tantas operações no currículo também foi titular da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core), tropa de elite da Polícia Civil Oliveira ainda se espanta. Até o papa se manifestou a respeito disso, admirou-se. Estou em êxtase, muito feliz. A população inteira está do nosso lado. Era desse carinho que a polícia do Rio de Janeiro estava precisando, afirmou ele, que entrou para a corporação em 1994.
O sonho de ser policial começou ainda criança. Logo quando aprendi a escrever, fiz uma carteirinha da Swat e levava comigo onde quer que fosse, revelou o policial. Em 2007, Oliveira teve a chance de fazer uma especialização na famosa polícia de elite dos Estados Unidos. Foi emocionante. Emocionante também foi o que ele viu nos barracos e vielas do Alemão. Quando já estava no alto do Areal (uma localidade da região), exausto, apareceu uma criança, de uns 7, 8 anos, que viu o meu cansaço e me perguntou se eu queria água, recordou o policial, com os olhos marejados.
Depois de tantos dias em alerta, correndo nas incursões, o chefe do Departamento Geral de Polícia da Capital, Ronaldo Oliveira, resumiu o resultado físico dos dias de operação na Penha: estou meio rouco e com bolhas nos pés . Formou-se professor de educação física, foi lutador de jiu-jitsu, trabalhou com futebol de salão, mas jurou que sempre quis seguir carreira na polícia.
Passou a usar a farda policial em 1989 e, nesses 21 anos de profissão, apontou como um dos fatos marcantes ter participado da prisão do traficante Elias Pereira da Silva, o Elias Maluco, em 2002. O criminoso foi julgado e condenado por envolvimento no assassinato do jornalista da TV Globo Tim Lopes, no mesmo ano.
Mesmo sob risco iminente, Oliveira disse nunca ter se arrependido de ter trocado o esporte pela arma. Questionado se o trabalho assusta, respondeu: ter medo... quem diz que não tem medo... sei lá. O policial de 46 anos e nascido na Tijuca, bairro da Zona Norte carioca, finaliza a entrevista dizendo, com orgulho, que crianças pediram para tirar muitas fotos com os policiais durante a ocupação nas favelas.