Futebol

Colunista faz comparativo entre Eurico Miranda e presidente do Flamengo

"Não fomos bicampeões por acaso. Aconteceu porque os jogadores recebem em dia, tem uma série de fatores. Se conseguirmos manter isso, o time pode continuar. O futebol tem um problema chamado gestão e tem que conhecer gestão. Eu conheço"

"Vejo sinais positivos na CBF. E contradições também. É nesse contexto que aceitei o convite para chefiar a delegação que vai participar da Copa América. Seria uma indelicadeza dizer não."

Duas declarações. Dadas por homens completamente diferente na análise de quem acompanha o futebol deste país. Um é considerado cheio de boas intenções, com visão diferenciada, moderna. Revoltado com o status quo, com a maneira que se administra o futebol neste país. Com o poder centralizado, o atraso da CBF, com coragem de enfrentar as inúteis federações.

O outro representa o coronelismo, a visão ultrapassada, os conchavos com os homens que mandam no futebol deste país. Na CBF, nas Federações. Principalmente a do Rio de Janeiro, onde gosta de sentar na cadeira do presidente. Homem truculento, capaz de ridicularizar adversários. Dançou na cabeça dos líderes do Bom Senso.

A lógica indicaria que a primeira fala, sobre gestão seria de Eduardo Bandeira de Mello. A segunda, sem dúvida, deveria ser de Eurico Miranda.

Mas é exatamente o contrário. Nesta segunda-feira, que o Vasco conquista o seu bicampeonato carioca. Invicto. Pela sexta vez na história não perdeu uma só partida no Carioca. Só aumentam os questionamentos sobre a postura condenável do presidente do Flamengo.

Eurico desperta mais respeito, mesmo não tendo indo para a Sibéria, com o Vasco rebaixado para a Segunda Divisão em 2015. E consegue valorizar ao máximo o desgastado e enfraquecido Campeonato Carioca. Posa e convence como vitorioso.

"Este título veio coroar uma campanha que os analistas, que são todos metidos a saber de futebol e acham que é só falar que um cara é melhor tecnicamente, quebram a cara. Levaram muito tempo para reconhecer que um time não fica 25 jogos sem perder se não for um belo time. Não precisa de nenhum figurão. É um título histórico, ultrapassamos todos os que conseguiram", discursava o presidente vascaíno, aplaudido com orgulho por seu grande amigo, Rubens Lopes, presidente da Federação Carioca de Futebol.

Aos 71 anos, Eurico não deixou de ser reacionário, ditador, se comportar como o dono do Vasco. Mas ampliou sua visão sobre o futebol. Sabe que o Vasco fechou 2015 devendo R$ 467 milhões. Tem plena noção de o quanto São Januário está ultrapassado. Mas acordou quanto a algo que nunca dedicou tanta atenção. Gestão. Está empenhado em fazer o clube respirar e para isso precisa do sucesso no futebol.

Teve a visão de apostar em um treinador sem grandes trabalhos. Muito questionado por sua religiosidade. Mas avisou que acreditava em Jorginho dentro do campo. E era isso que iria cobrar. E garantia que daria todo o seu apoio de 'dono do Vasco'.

E bancou jogadores rodados, baratos. Com a grande estrela sendo Nenê. Meia que aceitou ficar, disputar a Segunda Divisão, mostrando comprometimento inédito com um clube. Disse não ao assédio Palmeiras, Cruzeiro e Atlético Mineiro.

Eurico se mostrou ainda mais persuasivo ao fazer Jorginho dizer não ao milionário Cruzeiro e seu plano de chegar à Libertadores ganhando o Brasileiro. E aceitar seguir com as limitações do orçamento vascaíno. Ter o sonho menor de vencer a Segunda Divisão.

O dirigente vascaíno conseguiu dobrar os executivos da Caixa Econômica. Acertou por R$ 7,5 milhões. Metade do que recebia em 2015. Mas amarrou um acordo. Se o Vasco subir, ganhará um bônus de R$ 1,5 milhão. E terá novo contrato em 2017, com os mesmos R$ 15 milhões do ano passado.

Dentro do cenário recessivo do país, Eurico está se virando bem.

Enfrentado até tumores. Depois de retirar o da bexiga, se livrou de um no pulmão. Mesmo contrariando ordens médicas, não deixou de ir ao Vasco. A seguir administrando com mão de ferro.

"Aqui no Vasco mando eu. Ditatorialmente. São Januário é minha vida."

E se divertido com seu maior prazer. Vencer o eterno rival, o Flamengo. 

O clube que seria o exemplo de modernidade. Dono da maior cota de tevê do país. De maior torcida. De diretoria com conceitos 'ultramodernos' de administração. Clube que trouxe o tetracampeão brasileiro Muricy. Capaz da aposta milionária naquele que deveria ser o principal ídolo do futebol brasileiro. Guerrero.

Nada disso foi capaz de evitar os vexames diante de Eurico. O Flamengo já soma oito partidas sem vencer os vascaínos. Foram despachados sem pena da decisão do Carioca.

"Vasco e Flamengo é um campeonato à parte. E como eu me diverti esse ano", tripudia Eurico.

Do outro lado da trincheira, Eduardo Bandeira de Mello. Depois de 35 anos trabalhando no BNDES resolveu viver a vida política do futebol. Brigou e assumiu a presidência do clube que ama, o Flamengo. Descentralizador, dividiu o poder. Fez o que a maioria dos dirigentes de futebol no Brasil odeia: delegou funções. Apoiado por um grupo que se denomina revolucionário, partiu para enorme desafio. Os R$ 750 milhões de dívidas na Gávea.

Com muito afinco, o clube remodelou sua gestão econômica. Em três anos, já reduziu seus débitos em quase R$ 200 milhões. Hoje deve perto de R$ 550 milhões. Está remodelando seu atrasado Centro de Treinamento. Mas nada disso importa para os torcedores. Bandeira de Mello viu sua reeleição correr risco por causa do futebol. E apostou em um treinador caríssimo. Paga R$ 500 mil a Muricy e também decidiu investir no time. Guerreiro, Sheik, Mancuello, Cuellar...

Os resultados foram pífios. Os vexames seguidos. O clube está no meio de nova reformulação para o Brasileiro. O ambiente é tenso, tumultuado, com o fracasso no Carioca. A eliminação da Primeira Liga pelo Atlético Paranaense também pesa.

Mas para Bandeira de Mello, seu maior pecado, seu pulo no obscurantismo, no coronelismo foi aceitar chefiar a delegação brasileira na Copa América dos Estados Unidos. Convite feito pela CBF. Por seu presidente, Marco Polo del Nero. Parceiro de Rubens Lopes, presidente da Federação Carioca.

Marco Polo matou no berço a revolucionária Primeira Liga. Limitando o número de datas. A competição foi esvaziada. Bandeira de Mello acusou a participação de Rubinho junto a Marco Polo. Ele tinha razão. Mas três meses depois de tanta revolta, vai usar o agasalho verde escuro, com o distintivo da CBF no peito, nos Estados Unidos.

A postura combinaria com Eurico Miranda. Nunca com o modernoso Bandeira de Mello. O sim ao convite foi tão frustrante que, pela primeira vez, um dirigente teve de publicar nota para explicar porque havia aceito. As desculpas não convenceram ninguém.

O futebol é capaz de situações inusitadas.

Perto de absurdas.

Inacreditáveis.

Eurico Miranda virou símbolo de modernidade.

Bandeira de Mello do obscurantismo...

Fonte: Blog do Cosme Rimoli