Torcida

Carioca: supreendente como Ricky Martin saindo do armário

Flamengo, Botafogo, Vasco e Fluminense fazem as semifinais do carioca. Alguma surpresa? Só para quem se surpreendeu com o ex-menudo durante a semana...

- Quem viu o Flamengo em campo ontem deve rever alguns conceitos quanto aos méritos do título brasileiro. Apesar da vitória, que era mesmo obrigação, ver o ataque com Gil e Denis Marques obriga tal revisão a quem costuma atribuir méritos ao cartola Marcos Braz pela conquista do Brasileiro. Já ouvi que “ele foi cirúrgico em suas contratações” e por isso merece os méritos. Falam isso pensando em Maldonado e Álvaro. E esquecem de outras contratações do cartola. Que como Kléber Leite, contrata lotes e lotes para que um ou dois acabem dando certo, quando dão. Por isso mesmo, sempre defendi que o Flamengo foi campeão brasileiro porque ficou acéfalo, e assim acabou resgatando o melhor de suas tradições. Ah, as contratações cirúrgicas do cartola? Vamos lá: Alex Cruz, Flamel e Aleílson, (Asa de Marabá), Arthuro, Josiel, Denis Marques, Gil, Jonatas, Maxi, Hugo Colace, Dieguinho (Nova Iguaçu), Douglas (Santo André, 3 meses no Fla). Ainda acha que o cartola foi cirúrgico no ano que passou?

- Sobre o embate do cartola com com Pet e o atual momento do sérvio na Gávea já me pronunciei aqui nesse espaço. Sigo achando rigorosamente a mesma coisa.

- João Saldanha, Mestre Eterno de todo jornalista que não é muito chegado ao poder e aos poderosos, costumava ignorar propositalmente o nome de cartolas para não dar cartaz a eles. Fui obrigado a citar um nome acima, mas em geral procuro repetir o João Sem Medo. Melhor não repetir alguns nomes, não valem.

- As semifinais serão curiosas: Flamengo e Fluminense tem times melhores mas seguem jogando em 2010 muito abaixo do que podem. Vasco e Botafogo estão abaixo, bem abaixo. O torcedor de verdade, não aquele que considera qualquer crítica uma ofensa (cartolas adoram esse tipo, poupam os verdadeiros culpados e xingam somente a imprensa), não deve se iludir com qualquer eventual bom resultado na competição. Deve obviamente comemorar, beber todas, rir do adversário porque tudo isso é parte do futebol e é saudável, mas quando a festa terminar, saber que não tem time pra enfrentar o campeonato brasileiro. Pra depois não sofrer na última rodada.

- Sobre o Vasco, sigo lamentando o caminho escolhido de remontagem privilegiando um empresário, no caso Carlos Leite. Não é caminho condizente com o tamanho do clube.

- Vi Philippe Coutinho jogando, in loco, um sub 15 sul-americano. Já dava pra saber que daria jogador. Mas é curioso constatar que o tipo de jogador como ele é muito mais efetivo ainda entre os profissionais do que no meio da molecada. A correria meio desbaratada com 14 anos não privilegia necessariamente o jogador de mais talento. Agora, entre os homens, pode mostrar seu talento. Não por ontem, mas pelo campeonato.

- O título lá em cima é irresistível, mas não faz justiça com a campanha do América. Dito assim, parece que foi morno e sem emoção o final. Não foi. Até os 10 últimos minutos dava América entre os 4. E isso é muita coisa, ter chegado a essa situação. Saiu do mais profundo ralo em que estava para isso. Andei conversando com algumas cabeças coroadas do renascimento rubro. E o buraco era muito mais embaixo mesmo. E ainda é. E no entanto, o time chegou em quinto, está na série D, e por pouco não se meteu de penetra na festa dos grandes.

- Bota mais embaixo nisso. O time não se concentrava para os jogos. Por filosofia de Romário e também porque não tinha dinheiro, grana. Para nada. Isso fez diferença em alguns momentos mas a turma americana, formada por gente com muita esquina no futebol e anos de janela contornou. Algumas histórias são engraçadas.

- O Baixinho no comando. Marcius Fernandes na coordenação, com anos de estrada no futebol. Márcio Meira na preparação e Gabriel de treinador de goleiros no começo e depois treinador. Só cascudo, como se fala na língua deles. Começaram a reparar que tinha boleiro que não correspondia com a responsabilidade e maturidade de não ter que se concentrar...Com papo, mostrando que eram mais malandros do que eles, disseram que não queriam padres, seminaristas. Podiam sair, tomar a cervejinha deles. Mas em vez de 10, era preciso tomar só aquelas pra dar uma quebrada... E lembraram sutilmente que a noite do Rio estava coberta, radiografada, não tinha como escapar: Romário vendo tudo na Barra, e sabendo tudo o que acontece no subúrbio, de onde nunca saiu ou deixou de ir. Seu irmão Ronaldo como embaixador mais legítimo da Vila da Penha, Brás de Pina, Pilares, onde quer que o trem passe...Márcio Meira, veterano preparador que botou a galera pra correr, com anos de zona sul, com seu xará Marcius Fernandes. E Gabriel local nas praias do Rio...A boleirada se convenceu que não dava mesmo para querer ser mais malandro do que a malandragem naquele contexto, e a vara ficou mais curta...Histórias da bola, de malandragem que acabam lembrando o futebol de outros tempos, mais romântico e malandro. Foi assim, além de muito trabalho, que transformaram um grupo limitado e sem recursos em um projeto que deu certo.

- As limitações iam além. Sem grana para segurar a boleirada, dar almoço entre um treino e outro, só dava pra trabalhar uma vez por dia. Não foi possível parte física em um turno e treino no outro, como em alguns concorrentes. E para completar, muitos jogadores nem tinham carro. Alguns chegavam no treino de trem, gastando duas horas até o Giulite Coutinho.

- Se o Baixinho mostrou que sua mistura de trabalho e jeito deu e dá certo, teve em Gabriel um legítimo representante. Disse aqui que Gabriel foi o maior goleiro que vi no futebol de praia. E digo agora que Gabriel é maior revelação de treinador do campeonato. Além do jeito, Gabriel tem estudado muito e se transformado em um verdadeiro devorador de futebol. Assiste a todos os jogos, nacionais e estrangeiros. Estuda esquemas táticos, analisa o trabalho dos grandes técnicos. Chegou pra ficar.

- Reencontro alguns amigos do tempo do nosso Ipiranga, onde Gabriel fechava o gol na praia. Confirmam que o cara anda sumido, falam com ele e o sujeito tá sempre estudando, vendo jogos. “Virou o maior CDF, tá chato!”, me contam rindo. Mas valeu pra lembrarmos algumas histórias daquele tempo, com as risadas e nostalgia que os melhores anos de nossas vidas sempre trazem e aquele cheiro de tempo que não volta mais. Assim que Gabriel começou no profissional, saia todo mundo da praia pra ver o amigo no gol. Durango Kid, ia todo mundo de geral, depois de pular a roleta do 464. Sujos de areia, com fome de pós-praia, a barriga só sossegava quando o time de Gabriel atacava. Solidário, aproveitava para jogar umas laranjas pros amigos na geral... No final da resenha, um ponto era comum: voltar no tempo aquilo tudo valeria qualquer preço. Vida que segue, pra voltar ao João Sem Medo.

- Não foi bem o Santos ontem. E assim chego a seguinte conclusão: ver o Santos jogar está ficando como praia, botequim, pizza e mulher pelada: até ruim é bom.

Fonte: ESPN Brasil