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Veja trechos do discurso da posse de Eurico Miranda

Eleito presidente do Vasco para o triênio 2015/16/17, Eurico Miranda foi empossado na noite desta terça-feira em concorrida cerimônia na sede náutica da Lagoa. Em meio a assinaturas, no primeiro momento de emoção do novo presidente, a benção de um padre e a presença de autoridades como o prefeito do Rio, Eduardo Paes, e o ministro "palmeirense-vascaíno" dos Esportes, Aldo Rebelo, ele não conseguiu segurar a emoção durante o discurso de posse quando citou o apoio de sua família, em especial os netos, nos últimos anos.

No fim do discurso, o dirigente precisou parar a leitura por alguns segundos para se recompor e enxugar as lágrimas. Em seu texto, o presidente comparou o atual momento do Vasco, de baixa autoestima, com a época que iniciou sua caminhada em São Januário, há quase 50 anos. Eurico lembrou as origens do Vasco, a luta contra o preconceito racial e social, a construção do estádio e disse que o clube simbolizava "a personificação de que tudo era possível".

- Por esse perfil o Vasco se tornou tão popular. O Vasco é um clube atrevido por opção. O Vasco não nasceu em berço de ouro. Ele representava seus desejos, sonhos, a concretização do imaginário popular - disse o presidente do Vasco.

Diante dos problemas, principalmente financeiro, Eurico disse que o Cruz-Maltino precisa de remédios amargos para construir os alicerces necessários para que seus netos - e a torcida - tenham alegrias no futuro. Entre eles, citou ajustes econômicos com cortes de gastos, renegociações com credores e recomposição de dívidas fiscais.

- A minha história no Vasco é de desafios, de transposição de barreiras impostas. São quase 50 anos respirando o clube. Minha chegada ocorreu em um momento de negatividade, de sensação de impotência. O Vasco vivia um momento de resignação. Passei por diversas funções até que um dia cheguei a posição na qual sabia que poderia mudar esse sentimento de inferioridade. Foram mais de 20 anos recuperando a auto estima do Vasco. Se fiz algo nesse clube, além de auxiliar na conquista de títulos históricos, foi devolvê-lo à sua origem. Não fiz o Vasco grande, mas o lembrei de sua grandeza. Portanto o grande desafio desse novo ciclo que se inicia não é novidade para mim. O clube padece do mesmo mal de outrora, está internado com os mesmos sintomas de quando nele cheguei. Foi entregue ao segundo plano, diminuído, desrespeitado. Isso é percebido no comportamento dos nossos torcedores, que aceitam o falso destino que tentam nos impor. Resgatar esse respeito é a nossa primeira missão. Isso sem dúvida ocorrerá em pouco tempo. Não será fácil, mas é o momento de preparar os alicerces do futuro.  O Vasco precisa de bases sólidas para entender de uma vez por todas o seu lugar no desporto nacional. É natural que precisemos dispor de remédios amargos, controlar gastos, compor dívidas fiscais, negociar dívidas avulsas, recuperar a credibilidade. E ainda assim teremos equipes competitivas. Equilibrar necessidades e desejos é a forma ideal para atingirmos nossos objetivos.

Diante de centenas de presentes, Eurico contestou quem o classifica como retrocesso no futebol brasileiro e lembrou a renovação de quadros no Vasco. Ele garantiu ainda que São Januário está de portas abertas, mandando uma mensagem direta à imprensa.

- Falaram que minha volta representaria um retrocesso. Essas teorias não resistem a uma evidência: nenhuma corrente do clube foi capaz de renovar como nós. É o nosso segredo, a fórmula do nosso sucesso. Para a imprensa posso dizer que nossa relação era de incompreensões e desacertos. Mas acredito que uma convivência cordial e de respeito é possível e desejada. As portas do Vasco estarão abertas na medida que pudermos ser escutados nas críticas, o que considero ideal no bom jornalismo - frisou.

Confira a íntegra do discurso de Eurico Miranda:

"Vascaínos

A História do Vasco é de desafios e transposição de barreiras impostas. Em que pese não ter nascido em berço de ouro, sua vocação para a superação logo se fez conhecer.

Já no início do Século XX, a superação esportiva, simbolizada pelos seus prematuros títulos no remo e pela subida apoteótica da segunda para a primeira divisão. Neste sentido, destaque-se que o Vasco foi o único daqueles hoje conhecidos como grandes que começou de baixo, fora do que se tinha por elite na ocasião.

A superação social, quando tentaram nos segregar porque insistíamos em oferecer oportunidades aos desfavorecidos e negros, mesmo em ambiente que era hostil para ousados como nós. Não nos curvaram.

A superação patrimonial, fruto também das tentativas de segregação, que motivaram os vascaínos a construírem com as próprias mãos aquele que foi, na época, o maior estádio da América do Sul, ainda hoje um de nossos orgulhos, o Estádio Vasco da Gama.

Foi com esta marca que o Vasco se fez grande: um clube com gosto pelo desafio, inquieto por natureza, atrevido por opção. E foi por este perfil que se tornou popular: seus simpatizantes viram nascer e crescer algo que os representava, que representava seus desejos, que representava seus sonhos até mesmo pessoais. O Vasco era a concretização do imaginário popular, a ascensão em carne viva, a personificação do “tudo é possível”.
Como era de se esperar, este comportamento audaz trouxe reações. A principal delas no sentido de diminuir os feitos do clube e impor a ele rótulos. A insistência neste sentido fez lá os seus efeitos. E assim, quando o Vasco tinha pouco mais de meio século de vida, havia entre os vascaínos um injustificável acanhamento, algo como se envergonhar das origens de sua Instituição, mesmo com a possibilidade de desfilar uma relação de títulos invejáveis e inéditos, como o Sulamericano de 48.

A minha história no Vasco é de desafios e transposição de barreiras impostas. São quase cinquenta anos respirando o clube. A minha chegada, portanto, ocorreu exatamente no momento em que pairava no ar a negatividade, o baixo astral, a sensação de impotência. O Vasco vivia um momento de resignação, bem diferente do que nasceu para ser. É como se tivessem dito aos vascaínos que aquele era o seu espaço, o seu lugar e que dali não poderia sair.

Passei pelas mais diversas funções no clube até que, um dia, cheguei numa posição através da qual eu sabia que poderia mudar aquele sentimento de inferioridade. Foram mais de 20 anos recuperando auto-estima, recuperando identidade, recuperando o verdadeiro berço do clube. Se fiz algo por esta Instituição, além de auxiliar na conquista de títulos históricos, foi devolvê-la à sua origem. Não fui eu que fiz o Vasco grande, mas estou certo que o lembrei de sua grandeza.

Portanto, o grande desafio deste novo ciclo que se inicia hoje está longe de representar uma novidade para mim. O clube padece do mesmo mal de outrora. Está internado com os mesmos sintomas de quando nele cheguei. Foi entregue ao segundo plano, diminuído, desrespeitado. As consequências logo são percebidas no comportamento dos nossos torcedores, que passam a aceitar de forma resignada o falso destino que tentam nos impor, ao contrário da inquietação que é o maior símbolo da origem vascaína.

Resgatar este respeito é a missão prioritária. Que se tenha em mente que o clube precisa se respeitar primeiro para posteriormente exigir o respeito de fora. E isso, sem dúvida, ocorrerá em pouco tempo.

Estou consciente do delicadíssimo momento que enfrentamos. Por outro lado, entendo este momento como a grande oportunidade de se preparar os alicerces do futuro. O Vasco precisa de bases sólidas para entender de uma vez por todas qual o seu lugar no cenário do desporto mundial e seu papel social em função de sua vocação para exercê-lo.

Neste sentido, é natural que precisemos dispor de alguns remédios amargos. Será necessário controlar gastos, compor dívidas fiscais, negociar dívidas avulsas, recuperar credibilidade. Mas isso está longe de significar que não trabalharemos com vistas a disputarmos as competições com equipes competitivas.

Outra necessidade imperativa é retomar o investimento massivo em nossas categorias de base. Precisamos recondicionar os funcionais alojamentos para jovens atletas de nossa sede principal e voltar a investir em um dos símbolos da minha primeira passagem pela presidência do clube, o Colégio Vasco da Gama, destinado aos nossos atletas.

Equilibrar necessidade e desejo é a fórmula para atingirmos nossos objetivos. Buscamos este equilíbrio até mesmo na composição de nossos quadros. Houve e há uma série de discursos no sentido de que a minha volta representaria um retrocesso. Estas teorias, porém, não resistem a uma evidência: nenhuma corrente no clube foi capaz de renovar como nós. E pretendemos que este seja o segredo, a fórmula de sucesso: compor quadros experientes com novos quadros é o ideal. Sobretudo quando quadros experientes e novos quadros entendem perfeitamente o que é o Vasco e comungam da filosofia que o faz o gigante que é.

Caminhando para o encerramento, gostaria de fazer uma menção à imprensa. Sem dúvida, temos uma trajetória entre nós de incompreensões e desacertos. Acredito, contudo, que uma convivência cordial e de respeito é possível e desejável. As portas do Vasco estarão abertas na medida em que possamos ser escutados nas críticas, o que parece ser saudável para o bem do jornalismo correto.

Não posso terminar sem fazer alguns agradecimentos especiais àqueles que me reconduziram à presidência do Vasco. A começar pelo quadro social, que entendeu o momento do clube e brindou-me com uma votação espetacular. Muito obrigado pela confiança.

Homenageio, também, alguns companheiros que partiram, mas que desejavam intensamente este momento. Dentre outros, gostaria de mencionar os queridos amigos Amadeu Pinto da Rocha, Carlos Alberto Martins Cavalheiro, João Carlos Gomes Ferreira e Nelson Gonçalves. Estou certo de que, nesta noite especial, deram uma fugidinha do plano superior e estão por aqui, confraternizando conosco e muito felizes com este evento.
Estendo as homenagens aos meus antigos companheiros de luta no Vasco, aqui presentes, que sei que enfrentarão comigo neste tremendo desafio. Aqueles que estarão diretamente, compondo a diretoria, e aqueles que transmitirão boas energias para que tudo dê certo.

Agradeço profundamente a um grupo de jovens, nem todos tão jovens assim, que se formou lá atrás, o CASACA!. Não só pela lealdade, mas pelo incansável trabalho de conscientização e luta por um ideal. Dizem que sou o símbolo do atraso, do retrocesso, das ideias vencidas, mas ter por perto jovens que pensam o Vasco como eu, me faz acreditar que o processo que dá vida ao clube é contínuo.

Por fim, agradeço à minha família, que enfrentou comigo as agruras dos desafios já passados e, neste momento, ainda se encoraja para me ajudar a suplantar os desafios futuros. Especialmente aos meus netos, pois é para eles que gostaria de deixar um Vasco pronto para o futuro.

Encerro apenas dizendo que o Vasco não volta a ser grande hoje. O Vasco nunca deixou de ser grande. Nunca deixará de ser grande. Mas, com certeza, o Vasco volta a se entender como grande a partir de hoje, a agir como grande a partir de hoje, a querer como grande a partir de hoje. A inquietude é a nossa propulsão.

Saudações Vascaínas"

Fonte: ge