Vasco quer dar camisa e título de sócio remido a Pelé
Em abril de 1979, Pelé saiu da aposentadoria para vestir a camisa do Flamengo em amistoso beneficente contra o Atlético-MG, diante de 139 mil torcedores, no Maracanã. Mas, para entrar naquele time de Cláudio Coutinho, alguém teria que ceder lugar — e foi aí que cada um começou a defender seus metros de campo:
— O Andrade disse que ia jogar porque o Pelé não fazia a cabeça de área. Tita disse que entraria porque Pelé não jogava pela direita. Eu falei: ‘Eu vou dar a 10, mas a 9 é minha’ — relembra Zico, que cedeu a camisa eternizada por ele ao Rei.
Acabou sobrando para Cláudio Adão, sacado do time. Aos 38 anos, Pelé até teve a oportunidade de marcar um gol com a camisa do Flamengo, mas abdicou de cobrar o pênalti, mesmo após Zico lhe oferecer a bola. Coube ao Galinho empatar a partida e comandar a goleada por 5 a 1. O troféu da partida é guardado até hoje na sede do clube, na Gávea.
Foi a única vez em que Pelé defendeu o Flamengo, mas não por falta de tentativa do rubro-negro. Em 1969, o presidente do clube, André Richer, fez uma oferta milionária ao Santos, que recusou a investida.
— O Flamengo preparou um cheque de dois milhões de Cruzeiros, enviou um telegrama para o presidente do Santos, que falou que o Pelé era inegociável, que não existia preço para ele — conta o historiador Bruno Lucena.
O primeiro contato de Pelé contra o Flamengo foi aos 16 anos, em 1957, quando o Santos levou uma goleada no Maracanã: 4 a 0. Foram 19 jogos, com oito vitórias, cinco empates e seis derrotas.
Vascaíno desde a infância
Antes de ser imortalizado com a camisa do Santos, Pelé chamou a atenção da seleção brasileira com o uniforme do Vasco, clube do qual se declara torcedor.
A ligação com a cruz de malta vem da infância. Na década de 1940, o garoto acompanhava o pai, Dondinho, então jogador do Vasco de São Lourenço-MG. Mesmo crescendo cercado de corintianos no interior paulista, desenvolveu carinho pelo “Vasquinho”, como o Rei chama carinhosamente o clube da colina.
A chance de defender o Vasco veio aos 16 anos. Era 1957, e um combinado entre Vasco e Santos foi formado para disputar o Torneio do Morumbi, ao lado de Flamengo, São Paulo, Belenenses (POR) e Dínamo Zagreb (IUG). Ele assombrou a então capital federal e abriu caminho para sua história na seleção brasileira.
— Os jogadores principais do Vasco estavam em excursão. Como o torneio teria jogos no Rio e em São Paulo, ficou combinado que os jogos no Maracanã aconteceriam com a camisa do Vasco. Pelé marcou cinco gols — conta o pesquisador Mauro Prais. — O público e a mídia ficaram maravilhados. Graças a essas atuações, Pelé foi para a seleção, na Copa Roca.
Os jogos foram em junho. No mês seguinte, ele defendeu e marcou pela primeira vez pelo Brasil. As atuações impressionaram o Vasco.
— O Vasco fez duas tentativas para contratar Pelé. A primeira, logo após o torneio de 1957. Era Antônio Soares Calçada o dirigente do futebol, mas ele não teve sucesso. Pouco tempo depois, tentou de novo: além do Pelé, queria o Del Vecchio. A investida irritou muito os santistas, que responderam que queriam comprar o Bellini — lembrou João Ernesto da Costa Ferreira, que cuida do Centro de Memória do Vasco.
Além do título de sócio benfeitor remido, o Vasco deseja presentear Pelé com uma camisa pelos seus 80 anos. Depois de 1957, ele vestiria novamente o uniforme do time do coração em 1969. Após marcar seu milésimo gol, um dirigente vascaíno conseguiu furar a barreira de torcedores e jornalistas para entregar ao craque uma camisa. Pelé não hesitou em vesti-la.
Um tricolor na Nigéria
Foi defendendo o tricolor que o Rei do Futebol evitou uma verdadeira tragédia. Com intervenção até da polícia, o craque teve que entrar em campo em 26 de abril de 1978, na Nigéria.
O encontro não foi planejado. O Fluminense realizava excursão à Africa e disputou dois amistosos: primeiro, venceu a seleção da Nigéria, que teve Pelé, por 3 a 1. Depois, enfrentou o Racca Rovers com o Rei a favor.
Recém-aposentado, ele participava de uma ação de marketing de uma marca de eletrodomésticos. Por coincidência, estava na Nigéria no mesmo momento em que o Fluminense e acabou convidado para dar o pontapé inicial no amistoso. Mas não foi bem essa a notícia que circulou na imprensa local.
Rádios e jornais da região divulgaram que o Rei jogaria a partida. O simples boato levou 60 mil ao estádio.
— Quando a notícia saiu, houve uma comoção popular para ver o Rei. Esse jogo com o Racca Rovers foi em um estádio menor, e as autoridades locais falaram que não teriam condições de ter segurança se Pelé não jogasse — conta Dhaniel Cohen, do departamento de marketing do Fluminense.
Sylvio Vasconcellos, presidente à época, conversou com Pelé, que, com receio de uma tragédia, decidiu ir a campo. Mesmo aposentado, atuou por 45 minutos. O Fluminense venceu o Racca Rovers por 2 a 1, gols de Marinho Chagas e Arturzinho.
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