Valentim sobre VAR: 'Eu sou totalmente a favor'
Disponível no Fla-Flu de ontem (mas não acionado), o VAR, a partir de quarta-feira, deixa de ser um elemento eventual na vida dos clubes do Rio. As semifinais da Taça Rio terão o árbitro de vídeo, assim como as finais do Estadual e o Campeonato Brasileiro, que começa em seguida. Enquanto treinadores pensam em medidas de prevenção para lidar com uma tecnologia que mexe com a dinâmica do jogo, brasileiros que vivem no exterior, em ligas que já adotam o recurso, relatam o que mudou. E há um curioso paradoxo: a percepção de um jogo mais justo e mais limpo convive com o surgimento de “novas malandragens”.
O VAR pode interferir em quatro situações: revisão de qualquer infração ocorrida em jogadas de gol, lances de pênalti, expulsão ou identificação equivocada de jogador punido. Entre os jogadores que atuam sob a vigilância das câmeras, há o consenso de que a tecnologia funciona perfeitamente para esclarecer lances objetivos. Ainda que as controvérsias permaneçam em questões interpretativas, as decisões de arbitragem amparadas pelo vídeo fizeram todo o comportamento em campo se modificar.
— As reclamações com o juiz diminuíram muito. Em lance de impedimento, por exemplo, você não tem argumento. É o tipo de lance em que o vídeo não tem como errar — diz o volante Lucas Leiva, da Lazio, da Itália. — O jogo ficou mais justo. Mas é preciso melhorar interpretações de lances como o toque de mão.
Na temporada 2017/2018, a primeira com VAR na Série A italiana, as estatísticas indicam um novo comportamento dos jogadores: 45% menos simulações e 35% menos protestos graves contra a arbitragem.
O toque de mão a que se refere Leiva, lance que ficou emblemático após a eliminação do Paris Saint-Germain na Liga dos Campeões, é uma preocupação de jogadores e técnicos. Entre outras coisas, porque a revisão em câmera lenta induz à noção de intencionalidade.
— Ainda há erros, por vezes ficamos inseguros — afirma o atacante Joélinton, do Hoffenheim, da Alemanha.
Tanto ele quanto o zagueiro Samir, ex-Flamengo e hoje na Udinese, relatam que a grande área virou um território absolutamente novo em termos de comportamento. Onde antes eram normais os agarrões despudorados, o medo do pênalti impôs novos métodos.
MAIS DISCIPLINA
Aliás, no clube de Samir, o assistente de vídeo alterou totalmente a rotina.
— Nosso treinador pediu atenção para evitar agarrões. E eles diminuíram demais na área. É preciso bloquear o rival, mas ter sempre controle da posição do braço. Aqui, uma vez por mês temos reuniões com árbitros para que nos atualizem — revela Samir.
— Uma das primeiras coisas que o treinador (Simone Inzaghi) nos disse, logo após a implantação do VAR, foi observar como as jogadas seriam interpretadas, para entendermos como aconteceria — diz Lucas.
A sensação de justiça parece reconfortante para os jogadores. Mas não impede que uma nova malandragem surja.
— Falam para que a gente gesticule muito em lances de área, quando há um lance de falta. Para tentar chamar a atenção de quem está na sala do VAR. Assim, eles podem verificar o lance e evitar que a infração passe despercebida — conta Samir.
O impacto do árbitro de vídeo na geração de gols ou nas punições por cartões ainda parece exigir mais tempo para conclusões definitivas. Na Copa do Mundo, houve 29 pênaltis, onze deles marcados com auxílio do VAR. Quatro anos antes, foram apenas 16. No entanto, o número total de gols não aumentou. O que cresceu foi o percentual de gols marcados em bolas paradas: 42%, um recorde. O tempo esclarecerá se é tendência.
Na parte disciplinar, a expectativa de mais infrações flagradas por vídeo não se refletiu nas estatísticas. Ao contrário: a última temporada italiana teve 6,6% menos faltas, queda de 6,4% nas expulsões e 14,7% nos cartões. Resta saber se por influência do vídeo na conduta dos atletas.
A Liga Espanhola, que neste ano adota a tecnologia pela primeira vez, teve queda brusca nos cartões nas cinco primeiras rodadas: 4,34 por jogo, a menor em 27 anos. Mas, em dezembro, os cartões amarelos e vermelhos já superavam a temporada passada. Em todos os campeonatos com VAR, no entanto, registrou-se queda no número de simulações. Esta, uma clara conquista do vídeo.
FALTAS E PARALISAÇÕES
A convivência com um campo cercado por câmeras faz o futebol do Rio se preparar para ter o VAR de forma definitiva. Os treinadores revelam preocupações e o atual protocolo não é unânime. Por ora, a conversa com os jogadores será para evitar faltas que, antes, passavam despercebidas.
— A recomendação já havia para evitar faltas fora da bola, agressões. Por vezes, o zagueiro entra forte numa jogada e, quando o lance já está do outro lado, o atacante fica com aquela rixa, um cutucando o outro. Agora, tudo estará sendo visto — alerta Abel Braga, técnico do Flamengo.
Entusiasta do VAR, o técnico do Vasco, Alberto Valentim, diz que os defensores são o principal alvo de suas recomendações para partidas com a presença do assistente de vídeo.
— O principal é o pedido de atenção ao marcar, principalmente na área. Mesmo o que o juiz não vir pode ser marcado — diz o treinador. — Eu sou totalmente a favor do vídeo, mesmo que o jogo fique parado. Já se perde muito tempo com cera, simulação de lesão...
Abel, no entanto, pensa diferente:
— Acho que a consulta deveria ser em lance objetivo ou em lances em que o juiz de campo tenha dúvidas. Há consultas exageradas hoje. O árbitro deixou de ser autoridade máxima.
As paradas entre três e cinco minutos para solução de problemas também preocupam o treinador rubro-negro.
— Não ajuda. Você pode estar sufocando, num momento bom do jogo. Aí a parada é tudo o que o adversário quer. E você não pode fazer nada, só esperar — lamenta Abel.
De fato, os jogadores que estão no exterior admitem um certo prejuízo com paralisações mais longas.
— Você pode perder a concentração, o foco no jogo. Deveria haver um tempo limite para análise — afirma o zagueiro Samir.
Já Lucas Leiva, vê a situação com mais otimismo:
— Na Itália tem sido rápido. Mas é válido, porque são lances que podem decidir uma partida.
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