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Sul-Americanos: Bom negócio ou modismo?

Em 2006, a tradicional escola de samba carioca Unidos de Vila Isabel foi campeã do Carnaval com o enredo \"Soy loco por ti, América\". Longe de ter alterado os rumos do futebol brasileiro, o samba-enredo marca, coincidentemente, o início de uma onda de contratações de jogadores oriundos dos países vizinhos pelos principais clubes do Brasil.

Dois meses antes da vitória da escola de Noel Rosa e Martinho da Vila, por exemplo, o Corinthians faturou o Campeonato Brasileiro com os argentinos Carlos Tévez e Javier Mascherano, hoje nos poderosos Manchester City e Barcelona, no comando da equipe. E de lá para cá, o cenário de transferências manteve curva ascendente, o que fez os números atuais chegarem a valores antes impensáveis.

Apenas nas últimas cinco temporadas, 80 atletas de todos os nove países que disputam as Eliminatórias da Conmebol para a Copa do Mundo defenderam algum dos 12 principais clubes do país. A grande leva de jogadores, contudo, não significa, obrigatoriamente, qualidade e alto aproveitamento por parte das equipes.

Treinador de ideias fortes e visão crítica a diversas práticas adotados no futebol brasileiro moderno, Paulo Autuori vem comandando o trabalho de reestruturação do Vasco da Gama e não se mostrou muito animado em buscar nos países vizinhos as soluções para os problemas de seu clube.

\"Acho que a gente não deve seguir modismos. Quantos atletas estrangeiros, realmente decidem no futebol brasileiro. São poucos, o Conca, Montillo, o Guerrero, que foi meu jogador na seleção peruana. O Lodeiro também tem ajudado o Botafogo\", disse o técnico em entrevista coletiva recente, completando: \"Mas quantos não dão certo? Não podemos contratar por contratar, tem que chegar para decidir\", alertou.

Baixo custo facilita contratações, diz Parreira

Modismo ou não, a certeza é de que a participação de muitos atletas sul-americanos em nosso futebol é uma realidade. Coordenador da seleção brasileira, Carlos Alberto Parreira buscou analisar a massiva entrada de jogadores estrangeiros no Brasil por outro viés.

Para o ex-treinador, que comandou diversas seleções árabes, mas nunca trabalhou em algum país vizinho, a força da economia brasileira em comparação às de outros países do continente, em especial à da Argentina, principal fonte de atletas estrangeiros, que viveu forte crise em 2002, combina-se com o talento destes jogadores para atraí-los para nosso futebol.

\"Esses países viveram crises piores do que a nossa e, com o mercado nacional inflacionado como está, os jogadores de fora acabam virando bons negócios a um preço bem abaixo do que se pagaria aqui dentro\", pontuou o tetracampeão.

Sucesso no Sul fez outras equipes apostarem mais

Seguindo a mesma linha de Parreira, o comentarista da TV Esporte Interativo, Henrique Marques também não acredita em modismo nas contratações de estrangeiros. Segundo Henrique, o bom desempenho de estrangeiros vestindo as camisas de Grêmio e Inter, equipes que historicamente mais investem em jogadores de fora, despertou o interesse dos demais gigantes do país, trazendo a reboque uma maior quantidade de apostas erradas.

\"Grêmio e Inter sempre fizeram bom uso do mercado sul-americano. A diferença é que os clubes grandes do centro do país passaram a explorar mais esse tipo de contratação e como a quantidade de contratações desse tipo aumentou em todo o país, certamente mais erros ocorerram. Porém, essa prática segue muito válida\", analisou o jornalista gaúcho, lembrando que os acertos das equipes do sul, em nomes como Figueroa e Hugo de León, compensaram os erros cometidos.

A grande leva de estrangeiros no país também fez abrir uma discussão mais ampla que a simples qualidade dos contratados: a hipótese de que os clubes, amparados na facilidade e baixo preço
de atletas oriundos dos países vizinhos, deixassem de investir na formação de jogadores em suas categorias.

Em última análise, a situação seria um dos fatores para o mau rendimento da seleção brasileira, haja vista a atuação do time de Luiz Felipe Scolari diante do Chile nesta quarta-feira, em convocação que só contou com jogadores que atuam no Brasil. Tal possibilidade, porém, foi refutada por Parreira, que se ateve à explicação econômica do fenômeno.

Apesar de divergências, Parreira tem uma opinião que se encontra com a de Autuori. Para ambos, o talento é a condição primordial para um atleta fazer sucesso no país, seja ele estrangeiro ou brasileiro. A discrepância é que o treinador cruz-maltino, carioca como o campeão do mundo, deve ter ficado mais satisfeito com o título da Vila Isabel deste ano, que, em enredo sobre a agricultura, cantou o \"Brasil celeiro do mundo\" de produtos e craques.

Fonte: Yahoo Esporte Interativo