Futebol

RJ é um dos poucos estados a não adotar torcida única em clássicos no Brasil

Um fim de semana recheado de clássicos regionais é a oportunidade ideal para os torcedores celebrarem a paixão pelo clube e a rivalidade saudável nos estádios. Bem, nem para todos. Enquanto alvinegros e vascaínos dividirão o Nilton Santos, hoje, às 16h, pela nona rodada do Carioca, apenas os palmeirenses poderão assistir ao confronto com o Corinthians, na Arena Barueri, às18h, pelo Paulistão.

No Nordeste, não é diferente. Ontem, o Castelão recebeu o Clássico-Rei com as torcidas de Fortaleza e Ceará presentes na última rodada da primeira fase do Campeonato Cearense. Já em Salvador, o Barradão só terá torcedores do Vitória no BaVi de hoje, às 16h, pela sétima rodada do Baiano.

No Sul, os adversários até se encontram, mas ficam restritos a um canto do estádio do rival, como no Athletiba, hoje, no Couto Pereira, às 18h30, pelo Paranaense.

Trata-se de uma tendência crescente nos principais centros do futebol no país, em nome da segurança, segundo os envolvidos nas decisões. Em muitos casos, há recomendação do Ministério Público local, como em São Paulo desde 2016, além da anuência das federações estaduais e do poder público devido aos episódios de violência ocorridos dentro e fora dos estádios.

Em Pernambuco, os confrontos envolvendo Náutico, Sport e Santa Cruz, inicialmente, teriam torcida única, como em 2023. Porém, os clubes conseguiram liminar na Justiça para disputar os clássicos com torcedores de todos os clubes.

Em Minas Gerais, a vontade partiu de Atlético-MG e Cruzeiro, que decidiram jogar com torcida única até 2025. Maiores arrecadações e problemas com depredações do patrimônio foram os motivos.

— Há algum tempo, digo que, no Brasil, temos duas categorias: os clássicos de fato e os clássicos pela metade. Quando se fala em clássico, já se pressupõe um confronto histórico, grandioso, que divide e mobiliza intensamente uma localidade . Se você tirou uma torcida desse evento, então deixou de ser clássico — argumenta o pesquisador Irlan Simões. — O problema da torcida única é produzir uma imagem de que nós, torcedores, somos animais prestes a arrancar a coleira e matar um adversário. Não é assim. E digo até mesmo que a violência de grupos organizados tem menos a ver com rivalidade clubística e mais a ver com uma cultura masculina de violência urbana.

Combate à violência

O Rio continua sendo resistência. No regulamento do Estadual, a Ferj impõe que os clássicos sejam disputados com a presença das duas torcidas. E mais: no Maracanã, há a possibilidade de setores mistos nas áreas centrais do estádio mesmo após as reformas.

Décadas atrás, “ir de (cadeira) branca” significava ver o jogo ao lado do adversário. Nas partidas por competições nacionais, há casos em que os mandantes cedem só 10% dos ingressos.

Episódios recentes de violência entre organizadas nos arredores dos estádios reacenderam o debate no Rio (que teve um curto período de torcida única, em 2017). Algumas delas voltaram a ser banidas — todos os quatro grandes têm organizadas proibidas —, os clubes se comprometeram com a implantação de biometria e reconhecimento facial, de acordo com a Lei Geral do Esporte, e o poder público briga para ter um cadastro dos torcedores proibidos de ir aos estádios.

— Antigamente, as torcidas subiam a rampa juntas. Lá dentro se separavam. Quando você reprime demais, passa a olhar o outro como inimigo, e a violência aumenta — explica o sociólogo Ronaldo Helal.

Pela ótica da Polícia Militar do Rio, responsável pela segurança dos jogos — com efetivos de mais de 600 policiais, em média, e um batalhão especializado —, os clássicos, principalmente os disputados no Maracanã, têm condições de comportar duas torcidas. Até mesmo no Nilton Santos, como hoje, a PM garante condições de dividir a casa.

Os grandes problemas são, segundo a PM, a cultura de violência das organizadas, cujas brigas, normalmente, acontecem a quilômetros do estádio, e as punições brandas dentro do Estatuto do Torcedor. Nas arenas, o controle é mais fácil.

— Torcida única não é garantia de segurança. Vemos casos de brigas envolvendo organizadas do próprio time, brigas longe do estádio. A questão é rever a punição a esses torcedores. Com a torcida única, você acaba penalizando a família que quer ver o jogo, a criança que quer ver o ídolo... e o problema não vai ser resolvido, porque eles vão brigar em outro lugar — analisa o Coronel Luiz Henrique Marinho Pires, secretário de Estado da PM do Rio.

Fonte: O Globo