Futebol

Ricardo Gomes admite não voltar mais a ser treinador

Ricardo Gomes é um guerreiro.

Conseguiu a maior das vitórias.

Sobreviveu a dois AVCs, acidentes vasculares cerebrais.

O primeiro, pequeno, no dia 21 de fevereiro de 2010.

Isquêmico, quando ocorre a obstrução de uma artéria.

Quando era treinador do São Paulo e logo após um clássico contra o Palmeiras.

Não teve maiores consequências.

Voltou a trabalhar no Morumbi e não teve seu contrato renovado.

Depois de sete meses desempregado, assumiu o Vasco.

Fez um trabalho brilhante e conquistou a Copa do Brasil.

Veio o Campeonato Brasileiro e um clássico contra o Flamengo.

No dia 28 de agosto, em pleno Engenhão, veio o segundo AVC.

Gravíssimo.

Hemorrágico, uma artéria cerebral foi rompida.

O sangue inundou seu cérebro, teve de ser operado.

O prognóstico era decisivo, sombrio.

Ainda mais para quem deseja continuar trabalhando como treinador.

\"As situações de stress são sempre muito perigosas para quem já tem um quadro de hipertensão.

O nervosismo gera grande liberação de adrenalina, que lava a uma hiperdinamia (atividade muscular excessiva).

Isso aumenta muito a frequência cardíaca e a pressão, deixando o paciente muito vulnerável.

Uma pessoa que já tem um histórico de problemas nesse sentido deve evitar essas situações.

É a situação do Ricardo Gomes.

Não é recomendável voltar a treinar times de futebol\".

A opinião era do médico Marcelo Magalhães do Hospital Pró-Cardiáco.

Ele resumiu o que a enorme maioria dos médicos pensa.

Trabalhar no futebol depois dois AVCs seria quase um suicídio.

Só que Ricardo Gomes foi operado e nunca acreditou neste prognóstico.

Com o lado direito do corpo paralisado começou a fazer dolorosas sessões de fisioterapia.

Terríveis para quem já passou por essa situação.

Graças a um esforço absurdo, a direção do Vasco passou a acreditar na volta de Ricardo.

Roberto Dinamite, jogadores e o seu grande e fiel amigo Cristóvão passaram a visitá-lo constantemente.

A família dizia que esta atenção por parte do Vasco é o maior incentivo do treinador.

Só que o tempo passou.

Cristóvão acabou sendo efetivado no cargo.

E os progressos no tratamento de Ricardo Gomes tomaram um ritmo lento.

Normal para a maioria dos pacientes que passa por dois AVCs.

Não para Ricardo Gomes.

Em janeiro, ele fez questão de fixar o prazo da sua volta em junho ou julho.

Foi a pior coisa que poderia ter feito.

Veio junho e ele continua com sequelas importantes.

Normais para a situação, mas que abateram o seu otimismo.

\"O maior problema é o antebraço.

Não consigo escrever com a mão direita, por exemplo.

Só com a mão esquerda.

A escrita vai ser o mais difícil. Posso demorar de três a quatro anos.

Já sei que vai ser difícil encontrar a sensibilidade na mão.

Na perna, posso encontrar\", disse à excelente Marluci Martins, editora do jornal Extra.

A situação de Ricardo Gomes é muito mais delicada do que ele e o Vasco gostariam.

\"Recuperei totalmente a parte motora.

Falta a sensibilidade.

No início, eu nem mexia o braço direito, que parecia pesar 300 kg.

Agora, pesa 80 kg.

A perna está muito melhor, mas o braço...

A fala tem boa fluência, mas gaguejo às vezes e tenho mais uns 10% a melhorar.

Como vou trabalhar assim?\", pergunta.

Ele está frequentando sessões de fisioterapia até mais do que deveria.

Chega à sua casa todos os dias às 21 horas.

Apesar de toda a dedicação, Ricardo Gomes tem conversado com médicos e fisioterapeutas.

E a expectativa mudou completamente.

Em vez de colocar prazo para voltar a trabalhar como treinador, ele colocou outra data limite.

\"Se em dezembro eu não estiver recuperado, esquece. Vou parar\", disse para Marluci.

Ele já entendeu que suas chances de voltar a ser técnico são quase nulas.

Mesmo que, se por acaso se livrar das sequelas, médicos dizem que a profissão seria de altíssimo risco à sua vida.

Um terceiro AVC poderia ser fatal.

O departamento médico vascaíno já avisou Roberto Dinamite.

E ele não conta com o retorno do ex-treinador há muito tempo.

O melhor nesta incrível batalha que ele está vivo.

Poderia ter morrido em pleno Engenhão, se o atendimento médico não fosse imediato.

E apto para fazer várias outras coisas.

Como trabalhar como coordenador de futebol, bem menos estressante do que estar orientando um time.

Ele não quer ficar longe do futebol.

E em vez de ficar deprimido por não voltar a ser técnico.

Precisa é comemorar estar vivo, ao lado da sua família que tanto sofreu.

Poucos que tiveram dois AVCs, o segundo tão grave, tiveram a chance.

Ricardo Gomes mereceu esse prêmio...

Fonte: Blog Cosme Rímoli