Futebol

Mateus "Pet" Vital supera drama familiar para brilhar no Vasco

As cenas da tragédia não saem da memória. No carro onde estava com os pais, um amigo e um primo após um treino pelo Pavunense, vivenciou o terror. Do banco de trás, viu outro veículo fechar o caminho em uma das ruas da Pavuna, bairro da Zona Norte do Rio de Janeiro, para executar um assalto. Mas a tentativa virou tiroteio quando os bandidos perceberam a presença da polícia logo atrás do automóvel da família. Uma das balas acertou Viviane no assento do carona e tirou a vida da mãe do pequeno Mateus, com apenas nove anos na época.

- Lembro como se fosse ontem - recorda o jovem, atualmente com 17 anos.

As cenas da tragédia não saem da memória. Perder a mãe tão nova, com 32 anos, foi um baque para toda a família. Era ela a maior incentivadora da carreira do filho, que está no Vasco desde 2004 e na época treinava no Pavunense para se manter em atividade, pois as competições pelos grandes clubes eram escassas. Jorge, o pai, precisou superar a dor da perda e ajudar Mateus a fazer o mesmo para seguir no futebol. Hoje, ele joga pela mãe e realizou o sonho dela de chegar aos profissionais do Cruz-Maltino no mês passado.

- Às vezes eu paro, choro, mas é algo que deu para superar e eu sei que ela está feliz por mim. No começo meu pai não me acompanhava muito, então ela que me levava, buscava, quem mais me acompanhava. Aí depois disso meu pai passou a fazer esse papel. Costumamos conversar bastante sobre isso, era o sonho dela, então faço por ela, por mim e por toda a minha família. E sei que onde ela estiver está feliz em ver meu sonho, que é vestir a camisa do Vasco no profissional, e de toda a minha família que é vascaína - disse o caçula do casal, que tem duas irmãs, Bruna (23) e Daiane (21), além de uma mais nova por parte de pai: Juliana (4).

Mateus foi o primeiro da geração de 1998, ano mais vitorioso da história do clube com o título da Libertadores da América, a ganhar oportunidade no time principal. Ele largou na frente de outras joias de sua idade - como o meia Evander e o volante Andrey - devido à uma lesão na clavícula que o tirou da seleção brasileira juvenil no segundo semestre. O jogador se recuperou no Centro Avançado de Prevenção, Recuperação e Rendimento Esportivo (Caprres) e acabou chamando a atenção do técnico Jorginho nos treinos da base.

Antes de se reapresentar no próximo dia 6 para a pré-temporada, Mateus curte férias com a família no Rio de Janeiro e vive a expectativa de sua primeira temporada no time de cima. Apesar de ter entrado em campo durante o último jogo do Campeonato Brasileiro, ele apresenta suas características aos torcedores e revela dica de seus treinadores.

- Expectativa é a melhor possível, fazer uma boa pré-temporada e ajudar o Vasco. Sou um jogador que gosto muito de jogar ali na posição do Nenê. Sou habilidoso, tenho bom passe, sou suspeito para falar de mim, não gosto muito, mas é o que dizem. Gosto de chegar à frente também, não gostava muito de chutar, mas tive que aprender. Escuto os treinadores falarem: "Tem que fazer gol, senão não vai ganhar dinheiro". Tem que arriscar, senão não vou ganhar dinheiro (risos) - divertiu-se o jovem, que era o cobrador oficial de pênaltis nos juniores e que espera aperfeiçoar suas cobranças agora que irá treinar ao lado de Nenê.

- Esse é maestro. Vejo ele batendo pênaltis, não erra nem no treino.

Na ficha técnica do site oficial do Vasco, Mateus acompanha o sobrenome Vital. Mas experimente chamá-lo assim e correrá o risco de ficar no vácuo. É que todos o chamam de Pet, apelido que carrega desde os tempos de futsal em São Januário devido sua semelhança física com o sérvio Petkovic. Há preocupação antiga no clube de que a alcunha aumente a responsabilidade sobre o garoto, sem falar na referência a um ídolo do maior rival, o Flamengo. Mas o jovem, que tem "Pet" até em sua conta pessoal no Twitter, garante não se importar com isso e tira de letra reclamações de vascaínos por causa do nome escolhido.

PROMOÇÃO ÀS PRESSAS E ESTREIA SURPRESA

O sonho foi realizado às pressas. Após o corte de Thalles do jogo contra o Grêmio, no fim de outubro, Mateus foi chamado de última hora para o lugar do atacante na relação. O jovem já havia sido avisado para se apresentar ao profissional na terça-feira seguinte, mas na noite de sábado, véspera da partida, recebeu uma ligação do técnico Jorginho o convocando. Da casa da namorada em Duque de Caxias, município da região metropolitana do Rio, precisou acionar a família e o empresário para buscar uniformes em casa e o levar ao hotel onde o time estava concentrado. Sem nem ao menos treinar, ficou no banco.

- Foi um impacto. Sair da base direto para um jogo no profissional sem nem ao menos ter treinado. Mas fui feliz. Todos me receberam muito bem, já conhecia alguns por estar tratando a clavícula que quebrei. Um dia depois os caras pediram para eu dar uma palestra, me apresentar no meio do restaurante. Fiquei nervoso, mas consegui me sair bem - contou o garoto, que já conhecia Renato Kayzer da base e ficou mais próximo de Andrezinho, Guiñazu, Nenê e Nei.

Desde então, Mateus Pet passou a ser relacionado frequentemente, mas a estreia só aconteceu na última rodada do Campeonato Brasileiro, contra o Coritiba no Couto Pereira. Quando Diguinho saiu machucado aos 29 do primeiro tempo, o jovem admitiu que não esperava ser chamado por Jorginho naquele momento e comemorou a concretização de seu sonho, apesar de ter sido realizado na partida que decretou o terceiro rebaixamento da história do Vasco.

- Esperar não, mas sei que estava preparado. Já havia treinado, o Jorginho conversava comigo que não teria medo de me colocar, que eles estavam me preparando. E eu estava entendendo o trabalho deles e onde ele queria chegar. Dei o meu melhor para ajudar a equipe. Passou um filme na cabeça. Tenho certeza de que todo jogador que estreia no seu clube de coração passa por isso. Me vi pequeno, chegando ao Vasco com seis anos, e agora realizando meu sonho, é algo maravilhoso. Não tenho nem palavras pra expressar ou descrever o sentimento.

E a estreia pegou o pai de surpresa. Depois de Jorge ir a São Januário contra Corinthians e Santos e acompanhar outras partidas pela televisão na expectativa de ver o filho em campo, ele não esperava que poderia acontecer na última rodada, num jogo crucial para o Vasco. Tanto que sequer viu o jogo e estava num culto na igreja naquele momento. Acabou sabendo da notícias pelas irmãs, que não paravam de telefonar.

- Ele nem viu a minha estreia, foi para a igreja nessa hora. Era por uma boa causa, estava orando (risos) - brincou.

NOS PASSOS DE PHILIPPE COUTINHO, MAS...

Com a estreia no time principal do Vasco com apenas 17 anos, Mateus Pet repete o início de seu ídolo, Philippe Coutinho, no clube. Apesar de ser fã do argentino Messi e de Neymar, é o jogador do Liverpool, da Inglaterra, sua maior inspiração. E também com quem tem contato. Pelo fato de seu cunhado ser amigo do craque, o jovem sempre o encontra quando ele passa férias no Brasil.

- É em que me inspiro. Além de excelente jogador é um cara que eu vi na base, muito gente boa, humilde, família... Esse é o motivo de eu me inspirar nele, um cara que eu vi crescer e sei o que passou para chegar onde ele está. Grande jogador e grande pessoa, por isso é meu ídolo.

Além da estreia com a mesma idade do ídolo, Mateus Pet lembrou de outra coincidência envolvendo Coutinho: o fato de os dois terem a chance de começar com o Vasco na Série B. O garoto de 17 anos espera seguir os mesmos passos do craque, que defendeu o Cruz-Maltino entre 2009 e 2010, disputando 44 partidas e marcando cinco gols. Mas com uma ressalva.

- Ele pegou o Vasco na Série B, não é? Espero fazer essa carreira brilhante que ele está fazendo. Só espero fazer um pouco mais de história no Vasco, quero virar ídolo do Vasco e fazer história aqui. A maioria dos jogadores pensa em ir para a Europa, ganhar dinheiro, mas meu grande objetivo é fazer história no Vasco, que é meu time de coração - afirmou.

Fonte: ge