Futebol

Jornalista comenta projeto vascaíno de captação de recursos para a base

Como o Vasco quer direcionar parte do Imposto de Renda do torcedor ao futebol de base

O clube aprovou R$ 2,7 milhões via Lei de Incentivo ao Esporte para custear categorias infanto-juvenis. Agora vai mapear a torcida para encontrar potenciais doadores

O Vasco fez uma escolha ao montar uma nova estratégia para captar recursos para o seu futebol de base. Ou o clube apelava de maneira amadora a um pedido por dinheiro de torcedores, sem dar garantias nem contrapartidas, ou montava um projeto para levantar essa grana de um modo mais profissional e transparente. Marco Antonio Monteiro, vice-presidente de marketing, explicou no anúncio da parceria com a Ernst & Young que o time ficou com a segunda opção. A cúpula vascaína vai encarar a burocracia do governo para conseguir R$ 2,7 milhões para custear suas categorias de base.

O meio adotado é a Lei de Incentivo ao Esporte, coordenada pelo Ministério do Esporte, a mesma usada por vários outras equipes brasileiras para custear esportes olímpicos, base e infraestrutura. Mas com uma nova pegada. Enquanto os projetos aprovados pelo governo geralmente miram em empresas, capazes de assinar patrocínios mais generosos, o intuito vascaíno é convencer o torcedor, enquanto pessoa física, a fazer doações ao projeto com contrapartida no Imposto de Renda. Complicou? Vamos dar uns passos atrás para entender o mecanismo que embasa o projeto.

Na Lei de Incentivo ao Esporte, inspirada na Rouanet da indústria cultural, uma empresa pode abater até 1% de seu Imposto de Renda se fizer um patrocínio a um projeto incentivado. Uma pessoa física, até 6%. No caso de um torcedor que tenha uma renda de R$ 40 mil tributáveis ao final do ano, o mecanismo permite que ele redirecione R$ 130 para o futebol de base do Vasco. É pouco se você pensar numa pessoa só, mas pode virar um valor razoável se o clube conseguir convencer uma boa parte da torcida a fazer o mesmo. Esse é o plano. E a Ernst & Young tem um papel essencial para que ele funcione.

Ao mesmo tempo em que Eurico Miranda falava na entrevista coletiva sobre o projeto, o Vasco publicava em seu Facebook um chamamento para que o torcedor se cadastre no Censo Vascaíno. Trata-se de um formulário a ser preenchido com dados pessoais e algumas outras características: se o torcedor é sócio, se assina pay-per-view, se declara Imposto de Renda. Não por acaso. A consultoria vai organizar os dados dos vascaínos que responderem ao censo para tentar identificar potenciais doadores. Aqueles que declaram Imposto de Renda e que podem se interessar em canalizar uma parte do dinheiro que mandaria para o governo à conta bancária do projeto.

A estratégia vascaína foi colocada em prática com sucesso por só um rival até aqui, o Flamengo, com o Anjo da Guarda Rubro-Negro. Os adversários possuem um projeto incentivado vigente para investir em esportes olímpicos. Dos R$ 11,1 milhões aprovados pelo Ministério do Esporte, os dirigentes conseguiram quase R$ 2,4 milhões em patrocínios e doações, dos quais 54% têm origem em pessoas físicas.

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A busca de torcedores como "pessoas físicas" foi uma saída encontrada para um velho problema da Lei de Incentivo ao Esporte. A aprovação do projeto é burocrática, cheia de regras, mas é razoavelmente exequível. Difícil mesmo é encontrar patrocinadores e doadores no mercado para captar o valor aprovado. Atualmente oito clubes da primeira divisão do futebol têm projetos aprovados pelo Ministério do Esporte. A soma de todos os projetos chega a R$ 54,5 milhões, um valor considerável que deixaria de entrar conta da Receita Federal e iria para os cofres dos clubes. Só que, até aqui, apenas 5% foram arrecadados, ou R$ 2,6 milhões, com a maior parte correspondente apenas ao Flamengo. Atlético-MG, Corinthians, Cruzeiro, Palmeiras, Grêmio, Ponte Preta e Vasco, que já tinha um projeto para o remo, estão com arrecadações baixas ou zeradas.

Se tiver sucesso na captação dos recursos incentivados, o projeto vai aliviar minimamente as contas vascaínas. O valor não pode ser usado para pagar salários de atletas profissionais, limitação imposta pela Lei de Incentivo ao Esporte a todos, mas pode pagar bolsas-auxílio para jovens atletas, transportes, hospedagens, aluguéis de campos para treinamento, entre outros custos que o clube já faz com dinheiro próprio. Logo sobrará algum dinheiro a mais para direcionar ao futebol profissional. A Ernst & Young não tem nenhuma ingerência sobre a administração do dinheiro. Tampouco fará a auditoria dos balanços vascaínos ou das prestações de contas ao Ministério do Esporte. O papel da consultoria será especificamente o de analisar os dados dos torcedores para viabilizar o projeto.

Fonte: Época Esporte Clube