Jornalista aponta um dos quatro maiores times do Vasco
Tal qual os cientistas Tony Newman e Doug Phillips, da minha cult serie Túnel do Tempo, que revela quão velho sou, continuo viajando pelo passado e revendo grandes jogos de bola na pandemia. Revi por estes dias dois jogos icônicos do Vasco no ano de seu centenário, 1998: a semi da Libertadores e a disputa do Mundial Interclubes. Glória máxima do clube e de Juninho Pernambucano batendo o River Plate em Buenos Aires (a final contra o Barcelona de Guayaquil foi pra cumprir tabela, convenhamos); tristeza pela derrota para o Real Madrid, mas orgulho para os vascaínos que, a exemplo do que ocorreu ano passado com o rival Flamengo ante o Liverpool, jogou de igual para igual e poderia ter ganho.
Times campeões o Vasco teve incontáveis. Na minha percepção, quatro foram os maiores. O primeiro eu não vi, mas tenho relatos de torcedores mais velhos, incluindo um saudoso e fanático tio, atestando que o Expresso da Vitória do fim dos anos 40 e início dos 50 era fantástico - suponho que seja verdade, ou o time não seria base de seleção brasileira numa Copa do Mundo.
O segundo eu vi menino, o das temporadas 1977/1978, com destaque para uma zaga que se impunha (auto-intitulada "Barreira do Inferno"), um Dirceu moderníssimo de fôlego invejável e um temível e irresistível Roberto Dinamite no auge. Ganhou o primeiro Estadual, foi vice no outro. Faltou-lhe firmeza para ganhar o Brasileiro - em 77 foi surpreendido em casa para o Londrina e não chegou à semifinal. Um ano depois, chegou à semi, mas foi batido pelo Guarani de Careca, que seria campeão. E em 1979, já envelhecido, deu mais um passo, chegou à final, mas foi batido pelo Internacional do genial Falcão.
O terceiro Vasco talvez seja o menos brilhante como time, mas tinha alguns craques decisivos, foi bicampeão estadual de 1987/88 e conquistou o Brasileiro de 1989 - o que não é pouco. Começou com o talento dos futuros campeões do mundo Mazinho e Romário, a experiência de Tita e Roberto Dinamite, e fechou o ciclo - e aí vi mais de perto pois já era jornalista esportivo - com o não menos genial Bebeto e a juventude de Bismarck, William e Sorato.
Cobri pouco o Vasco em 1998. Mas, claro, por dever de ofício e por ser apaixonado por futebol, marquei de perto aquele grupo, que foi montado sem grandes revoluções por Antônio Lopes. Um treinador com muita experiência em futebol, e que vibrava como poucos eu vi quando dirigia o Vasco - foram, de fato, feitos um para o outro. Aquele time era intenso, um jogador corria pelo outro e, com a segurança de um sistema defensivo simples mas azeitado, tinha confiança para deixar Ramon pensar o jogo, Felipe e Pedrinho brilhar e quebrar marcações, e fazer a bola chegar em boas condições para o furacão Donizete e o matador Luizão. Juninho entrou nessa engrenagem no fim, decidiu de certa forma a Libertadores, e quase faz o Mundial pender para o lado brasileiro.
O Vasco tinha mais time do que o River, mas este, além da confiança de decidir no Monumental de Nuñez, tinha dois trunfos principais: a experiência de Burgos e Sorín na seleção, e dois meio-campistas extremamente inteligentes, que não à toa viraram excelentes treinadores (o espanhol Pizzi e "el muñeco" Gallardo). Até que surgiu aquela famosa falta...
Contra o Real, o Vasco acabou sendo superado pela maturidade dos merengues, quase todos habituados a decidir competições internacionais e com currículo em seleções e Copas do Mundo - além de um baita treinador, o holandês Guus Hiddink, a meu ver muito subestimado naquelas enquetes clássicas sobre grandes treinadores das últimas décadas. E quem ainda não tinha tanto currículo ali, tinha talento e iria construí-lo - como o italiano Panucci - que jogaria na Azzurra em 2002. Mais decisivos que ele, contudo, nomes que dispensam apresentações mesmo aos meus mais jovens leitores - o goleiro alemão Illgner, Roberto Carlos, Fernando Hierro, o argentino Redondo, Clarence Seedorf e um Raul Gonzalez que na seleção espanhola brilhou pouco, mas que, como Lopes e Vasco, parece ter nascido para ser campeão no Madrid.
O time espanhol teve o trabalho muitíssimo facilitado pelo gol contra de Nasa, no primeiro tempo. Teve paciência para conter um Vasco corajoso, fazer o tempo passar, colocar paulatinamente peso nos ombros dos adversários, que não se intimidaram e empataram. E aí vem a velha discussão que tantas vezes ouvi sobre a seleção de 1982: se o Vasco tivesse sido mais cauteloso... O "se" não joga, e jamais saberemos o que aconteceria se não acontecesse o que aconteceu. O Vasco foi grande e sentiu a chance de vencer. Mas teve diante de si dois jogadores gelados: Seedorf, com um lançamento de mais de 40 metros, perfeito, para Raul. Vítor e Odvan se assustaram, deram o bote errado, sim. Mas haja talento e frieza para, numa final desse tamanho, dar dois cortes de pelada de rua e tirar de Carlos Germano...
Assim como o Flamengo vai lamentar por anos a bola de Lincoln, ano passado, os vascaínos que viram o jogo terão pesadelos com a bola de Felipe e a outra que Sanz tirou em cima da linha, no finzinho do jogo, com Illgner batido. A taça não veio, mas aquela geração pode tranquilamente pleitear o título de melhor Vasco de todos os tempos. Eu queria ver um jogo desse Vasco contra o Vasco de 1977...
Fonte: Blog Entre as Canetas-ge