Futebol

Jogadoras do sub 15 do Vasco gandularam em Itália x México

O time é unissex. Todos jogam futebol, mas, neste domingo, vão atuar à beira do campo. Pela regra, são 14 titulares, que prometem rapidez e sincronismo de movimentos como gandulas. O gol deles será repor a bola sem erros para não atrapalhar os craques de México e Itália na partida deste domingo, às 16h, no Maracanã, que completa o Grupo A da Copa das Confederações.

Com idades entre 13 e 15 anos, os nove meninos e cinco meninas moram em São Gonçalo, no Grande Rio. Jogam futebol nas categorias infantil e juvenil. Como equipes, eles venceram a Copa Coca-Cola, que deu como prêmio a oportunidade de serem selecionados para trabalhar como gandulas na Copa das Confederações.

Ser gandula, por enquanto, rende mais mimos do que jogar nas divisões de base de clubes pequenos ou do futebol feminino.

— Ajuda de custo? No máximo, o clube paga a van nos dias de jogo e dá pão com Guaravita ou suco de groselha, de lanche. Como gandula, também não há dinheiro, mas ganhamos bolsa com casaco, tênis, chuteiras e material esportivo da Adidas — conta o lateral-direito Fabrício, de 15 anos.

A exemplo dele, todos os meninos do grupo que trabalhará neste domingo defenderam a equipe de São Gonçalo, sob o comando do técnico Carlos Aragão, que nos tempos de jogador do Fluminense era chamado de Carlinhos Carioca. As cinco meninas atuaram pelo Lusitânia, mas, na verdade, são do Vasco e treinam em São Januário.

Balotelli, feio e preferido

Tietagem, para os 14, só foi permitida na última quarta-feira, quando os jovens escalados para a primeira partida da competição no Maracanã se encontraram em frente ao Bellini, a Estátua do Jogador.

— Nada de pedir autógrafo, nem de tirar foto com jogador. Pedir camisa, nem pensar — sabe de cor Júnior Valente, de 15 anos, atacante das divisões de base do Carapebus/Mauá.

A resposta à pergunta sobre qual jogador de México ou Itália os atrai é imediata e provoca um quase uníssono.

— Balotelli! — grita mais alto do que outros 11 colegas a extrovertida Letícia Botelho Picanço, meia-esquerda de 15 anos.

— Balotelli é feio demais, mas joga muito — emenda Joyce Rocha, cabeça de área de 14 anos, provocando risadas da turma.

Escolha solitária, o italiano Buffon é o preferido de Igor Teixeira, de 14 anos. Por razões óbvias.

— Sou goleiro — diz.

Admirador do mítico capitão da Squadra Azzurra, Igor faz pesquisas na internet de grandes defesas e avalia a técnica dos grandes goleiros. A mãe dele assiste e filma todos os seus jogos.

— É um verdadeiro reality show que a minha mãe faz comigo — ri Igor.

Torcedor do Flamengo, o garoto participou do projeto apoiado pelo rubro-negro Léo Moura em São Gonçalo e recebeu, das mãos do lateral, o prêmio de melhor goleiro da última edição.

Sonhando jogar em um clube grande, Igor tem apoio total da família. Como todos os meninos da turma.

—Pai, mãe, avô, avó, todo mundo incentiva — vibra o volante Lucas Miranda.

Para as meninas, as barreiras começam, às vezes, na própria família.

— Minha avó é contra. Acha que o futebol é coisa de menino. Mas minha mãe apoia. Nada disso me chateia. Continuo porque gosto — conta Letícia, sem mágoa alguma.

Drama superado em grupo

Mas quando alguma vizinha faladeira mete a colher na vida alheia, a coisa esquenta.

— A mulher foi falar que eu estava jogando bola, e a minha mãe meteu a porrada nela — entrega a lateral-direita Andressa, de 15 anos.

Joyce Rocha começou a jogar bola de tanto ser levada para os treinos para assistir à irmã mais velha, Juliana, de 17 anos, que não podia deixá-la sozinha em casa.

— O futebol feminino não é valorizado, e, por isso, atuar como gandula pode dar mais destaque ao nosso esporte — diz a simpática adolescente.

O dia a dia muitas vezes difícil em busca de realizar o sonho de brilhar no futebol como profissional também fortalece o coração de estudante desta garotada boa de espírito. Durante um ano, os companheiros foram o ombro amigo de Renan Azevedo de Oliveira, que viu a mãe, Alcimeri, perder a luta contra um câncer no mês passado.

— Mesmo doente, ela me levava aos treinos e sonhava me ver ganhando esse prêmio — recorda Renan, de 15 anos.

Agora, é o pai, Fábio, que mantém vivo o sonho do garoto de vingar no futebol. A segurança de Renan impressiona, diante das memórias difíceis e também dos sonhos do futuro:

— Aqui é uma família, uma turma boa. Um torce pelo outro.

Futuro que, se não vier pelos tortuosos caminhos da bola, eles sabem, precisará ser trilhado, possivelmente com menos dificuldade, através do estudo.

— Quero ser jornalista, tio! Vou mandar para o senhor o meu currículo, completinho e bem bonito, quando chegar a hora — avisa Letícia, sem as firulas de uma meia-esquerda, sonhando entrevistar os craques dos gramados no futuro.

Uma coisa é certa: este domingo jamais sairá da memória desta turma sincera.


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Fonte: Globo Online