Futebol

Folclórico, Campeonato Estadual do Rio mantém seu charme com o tempo



Você já ouviu falar no Manga, antigo goleiro do Botafogo que afirmava gastar o “bicho” antes dos jogos contra o Flamengo porque a vitória era certa? E já escutou a música Fio Maravilha, homenagem ao atacante homônimo de futebol desengonçado? Com certeza já viu o gol de barriga de Renato Gaúcho na final do Carioca de 1995. São por essas e outras que o Campeonato Estadual do Rio de Janeiro é apontado por muitos como o mais charmoso do Brasil. Sem dúvida, uma competição recheada de jogadas e figuras folclóricas, que deixam ainda mais quente e divertido o já irreverente cenário carioca.

Na década de 60, Aílton Correia Arruda, apelidado de Manga por causa do rosto marcado pela varíola, fez história com defesas incríveis pelo Botafogo - apesar de ter quase todos os dedos das mãos quebrados. Além disso, tinha grande habilidade para provocar a torcida do Flamengo antes dos clássicos. Do lado rubro-negro, um jogador ficou tão conhecido pelo seu jeito “folclórico” que foi eternizado em música de Jorge Ben Jor. Perna-de-pau assumido, Fio Maravilha fazia a festa da torcida rubro-negra nas décadas de 60 e 70 com seus gols desajeitados.

Apelidado de Rei do Rio após a final do Estadual de 1995, Renato Gaúcho enlouqueceu a torcida do Fluminense ao marcar, de barriga, um dos gols mais antológicos da história do Campeonato Carioca, aos 41 minutos do segundo tempo da decisão do campeonato daquele ano, contra o Flamengo, num Maracanã lotado por mais de cem mil pessoas. Em 1997, outro episódio se tornou memorável na história dos estaduais do Rio: a “dança da bundinha” de Edmundo, no primeiro jogo da final daquele ano, entre Vasco e Botafogo.

Um dos protagonistas do lance, o zagueiro Gonçalves – que marcava Edmundo quando este mostrou sua ginga – disse que a irreverência é um dos principais fatores responsáveis pelo brilho do Campeonato Carioca. “O Estadual do Rio sempre teve essa pimenta em função da rivalidade entre os clubes e da qualidade dos jogadores que passaram pelos times. Isso contribui muito para valorizar a competição e para despertar o interesse dos torcedores não só daqui, como de outros estados”, afirmou Gonçalves em entrevista ao site Justicadesportiva.com.br.

O ex-zagueiro comentou ainda o lance de provocação que mais o marcou e aproveitou para falar de outra rivalidade inesquecível da competição. “Sem dúvida, aquele episódio com o Edmundo chamou muita atenção. Ele acabou dando uma apimentada a mais na disputa daquele ano, que ainda teria mais um jogo. Até hoje, sou parado por vascaínos que comentam o lance”, disse. “O Carioca sempre teve rivalidades marcantes, que dão um clima especial aos jogos, como a disputa entre Roberto Dinamite e Zico, na década de 80”, completou Gonçalves.

Ainda mais recente, em 2008, as lágrimas em sintonia de vários jogadores do Botafogo, em entrevista coletiva após derrota para o Flamengo na final da Taça Guanabara, no episódio apelidado de “chororô”, foi outro acontecimento que entrou para o folclore do Campeonato Carioca. Para o ex-jogador Júlio César, figura também marcante no futebol carioca que ganhou o apelido de Uri Geller - uma alusão ao famoso ilusionista - pelos dribles desconcertantes que dava nos adversários, a brincadeira que se faz em torno dos acontecimentos é o grande trunfo do Campeonato Carioca. “Desde sempre, o futebol carioca é movido pela ironia. A brincadeira com o ‘chororô’ é um exemplo disso. Às vezes, eu recebia uma caixa de bombons de um costumeiro marcador adversário na véspera de um jogo e, quando abria, tinha uma mensagem dele dizendo que iria me pegar na partida. Na hora em que a bola rolava, a rivalidade sempre era transformada em gozação pelos torcedores”, relatou.

Segundo Uri Geller, que ganhou destaque na ponta esquerda do Flamengo nas décadas de 70 e 80, muito da irreverência do futebol do Rio vem da pelada de rua carioca. “Nos outros estados, você não vê isso. Aqui, tivemos jogadores que mostraram esse lado irreverente, como Romário, Edmundo, entre outros. Essa brincadeira tem tudo a ver com a pelada carioca, jogada nas comunidades. Costumo falar que eu tabelava com o meio-fio quando garoto. Creio que isso passe para dentro de campo”, disse.

Xodó da torcida do Flamengo, Obina, pelo seu carisma, já chegou a ser comparado ao próprio Fio Maravilha e é um dos personagens mais recentes do folclórico Campeonato Carioca. Para esta temporada, o Vasco contratou o também atacante Rodrigo Pimpão, cujo nome o transforma em forte candidato a entrar para o rol de figuras inusitadas que marcaram a competição. Enfim, com todo esse histórico, a nova edição do Estadual do Rio de Janeiro, que começa neste sábado, é promessa de rivalidade, alegrias e tristezas. Sempre com muito charme e irreverência, é claro.

Fonte: Justiça Desportiva