Feminino: A história de Simone, atleta do Vasco
Os grandes vitoriosos no futebol normalmente são aqueles reconhecidos por títulos. Mas nem toda sensação de conquista está refletida apenas no brilho de um troféu, principalmente quando o assunto é o futebol feminino no Brasil.
Os desafios no caminho de um sonho podem render histórias de superação, como a trajetória da meio-campista Simone, de 23 anos, que hoje veste a camisa do Vasco. Longe de casa, ela deixa a filha Sophie, de quatro anos, com a avó paterna para tentar consolidar a carreira.
— É complicada essa distância. Apesar dela até ficar bem entretida lá com os avós, ainda assim ela sente saudades. Mas quem sente mais sou eu, que fico aqui pensando nela e sempre ligo para a avó dela para ver como Sophie está. E eu nem posso ficar conversando muito com ela pelo celular, porque ela sabe que estou longe e vai ficar lembrando de mim - lamentou Simone.
Tudo começou há quatro anos. O futebol profissional ainda não era realidade na vida de Simone, que nasceu e cresceu em Resende, cidade fluminense a cerca de 150 km da capital.
Se o presente de jogos e competições ainda não passava pela cabeça, a carreira pareceu ainda mais improvável quando ela ficou grávida.
— Não foi uma coisa prevista, eu estava com o pai da minha filha há apenas seis meses e tomava remédio. Eu fiquei muito preocupada, principalmente com o meu pai, que já é de idade, mas ele aceitou bem. Já a minha mãe não recebeu muito legal, mas depois que a Sophie nasceu, tudo mudou e minha família me ajudou muito - revelou a atleta.
Até os três primeiros meses de gravidez, Simone ainda atuava em times de futsal da cidade, mas a barriga foi crescendo junto com a responsabilidade e ela precisou dar uma pausa. Aos 19 anos, ela guardou as chuteiras para o jogo mais importante da vida: cuidar da filha.
Divulgação/Vasco da Gama
— Eu joguei até onde deu, mas tive que parar por causa da gravidez. Quando eu estava com cinco meses, surgiu uma grande possibilidade, uma peneira em Resende da seleção brasileira, mas eu não consegui participar - lamentou.
Meses depois da Sophie nascer, Simone sentiu que era hora de voltar. A filha estava crescendo e ficando cada vez menos dependente dela. A distância é o preço a se pagar pela vontade de mudar a vida da família.
No começo do ano passado, ela foi aprovada em uma peneira do Pérolas Negras, time que se mudou recentemente para a cidade de Resende. Só que os planos foram adiados mais uma vez: por causa da pandemia, os treinos foram suspensos.
As atividades foram retomadas apenas no fim do ano. A passagem foi rápida, mas vitoriosa. Simone foi campeã da Taça Diamante Pró e disputou o Campeonato Carioca, competição que foi o grande divisor de águas em sua carreira.
Ao enfrentar o Vasco, Simone se destacou e chamou atenção do treinador adversário. Deu match. Um grande passo daquela adolescente resendense que via na bola sua esperança para o futuro.
— De onde eu venho, eu achei que o futebol seria apenas um sonho que eu não ia conseguir realizar. Não tinha muita oportunidade na cidade, não tive o apoio da minha família e eu tive que começar a trabalhar muito cedo, com apenas 10 anos, tendo que conciliar com os estudos. Tive que batalhar muito para alcançar o meu sonho - disse Simone.
Com a camisa do Vasco, Simone por enquanto só atuou em dois amistosos. A estreia em jogos oficiais ainda não aconteceu porque ela está em fase de recuperação de uma lesão no joelho.
— É muito gratificante chegar em um clube grande como o Vasco. Um time que revelou grandes nomes para o futebol feminino, como Marta e Pretinha, e no masculino, como Romário e Roberto Dinamite. É uma honra estar aqui e agradeço muito ao clube por abrir as portas para mim - disse.
O Vasco de Simone disputa a Série A2 do Campeonato Brasileiro, equivalente à segunda divisão do futebol nacional. Se o sonho de se tornar jogadora já foi realizado, as próximas metas já estão definidas: disputar uma Libertadores com a camisa vascaína e entrar no radar da técnica Pia Sundhage.
— Toda mulher que sonha no futebol tem objetivo de vestir a camisa da seleção brasileira. Sei que não é fácil, tem muitas jogadoras boas no nosso país, mas se hoje estou no Vasco é porque vale a pena a gente sonhar. O meu outro sonho é jogar as principais competições, como a Libertadores, e seria muito legal realizar isso aqui no Vasco - comentou.
Outro objetivo pessoal é conseguir se estabilizar financeiramente na capital para buscar a filha para viver com ela.
— Eu penso em trazer minha filha para o Rio, me estabilizar aqui e ter uma garantia financeira que dê para mantê-la aqui. Quero dar uma boa qualidade de vida para ela, com um estudo melhor do que eu tive e, se ela quiser virar jogadora também, vou apoiá-la muito - prometeu Simone.
Fonte: ge