Ex-Vasco, Sidnei deixa de lado o futebol e hoje atua como socorrista
Já salvei muito o Acácio, o Régis, o Carlos Germano, o Márcio e o Caetano (risos). Entrava na linha de frente.
Intervenções precisas com os pés e a cabeça permitiram ao ex-zagueiro Sidnei, campeão brasileiro (1989) e tri estadual pelo Vasco (92/93/94), evitar muitos gols em cima da linha. Hoje, os pés dão lugar às mãos que o capacitam a ser um dos heróis da área de saúde durante a maior pandemia desde 1918. Aos 49 anos, salva vidas como socorrista desde setembro de 2019.
- Alegria. As duas profissões me deram muita alegria e satisfação. A alegria de salvar vidas está sendo um prazer, uma surpresa muito grande na minha vida. É muito valioso para a gente salvar uma vida. Quando a gente consegue reverter o caso, a equipe fica muito feliz sabendo que uma pessoa se recuperou no hospital.
Se enquanto jogava o prata da casa de São Januário se destacava pela versatilidade, já que também atuava como volante e lateral-esquerdo, o mesmo acontece em sua nova função. Com diversos cursos, está habilitado a não apenas a prestar os primeiros socorros, mas também a dirigir ambulâncias. Sidnei é um condutor-socorrista.
Antes de trocar o uniforme e as chuteiras por macacão, capacete e luvas, Sidnei seguiu o caminho que é muito comum a ex-atletas e trabalhou no futebol. Foi observador técnico e coordenador de avaliação do Vasco quando Roberto Dinamite era presidente. Depois de cinco anos no clube que o revelou, assumiu a coordenação geral do Barra Mansa, onde conquistou a Série B do Rio em 2014.
Na sequência, tentou seguir no futebol, mas algumas recusas o decepcionaram, e uma conversa mudou sua vida. Foi convencido a ingressar na área da saúde. Fez prova, vários cursos e tornou-se socorrista. Hoje está apaixonado pelo que faz e presta serviço à Autopista Fluminense Arteris, na BR 101. Sua carga horária é compreendida entre 19h e 7h do dia seguinte.
Mas quem pensa que Sidnei parou está enganado. Mesmo aos 49 anos, tem fôlego de atleta e iniciará um curso de técnico em enfermagem, cujo período é de um ano e nove meses. Depois disso, vai encarar mais cinco anos de faculdade (à distância).
Confira a seguir o papo na íntegra e conheça a história de um homem que, a exemplo dos seus colegas da área de saúde, arrisca sua vida em uma das pandemias mais devastadoras da história:
Como a profissão de socorrista surgiu em sua vida?
- Foi uma decisão difícil. Foram cinco anos no Vasco e depois fiquei dois anos e pouco sem trabalhar no futebol. Fiquei um pouco desgostoso com o futebol. Tentei várias vezes, fui a outros clubes, faziam promessas para lá e para cá, mas nunca chamavam. Comecei a perder interesse pelo futebol. Vi que, mesmo após fazer bom trabalho no Vasco, chegou um momento em que as pessoas estavam me recusando. E todo mundo me conhece no futebol, sabe que sou muito correto.
Aí pensei bem, conversei bem com uma amiga que é minha ex-cunhada e trabalha como técnica de enfermagem na Arteris.
Ela me indicou e falou: "Pô, Sid, faz o curso de APH (Atendimento Pré-Hospitalar). E fiz esse curso, fiz a prova para a São Francisco Resgate (empresa terceirizada que atende a Arteris)". Depois me falaram que passei na prova e me chamaram em seguida para fazer os treinamentos e me contrataram. Passei por 90 dias de experiência e fui contratado.
Prazer em salvar vidas
- Para mim, está sendo gratificante. Lidar com vidas é um procedimento complicado. Há situações momentâneas em que vamos para a ocorrência sabendo que tem risco de morte. Acabei acostumando com esse procedimento de atuar.
É muito valioso para a gente salvar uma vida. Quando a gente consegue reverter o caso, a equipe fica muito feliz sabendo que uma pessoa se recuperou no hospital.
Responsabilidade como socorrista e condutor
- Tenho a responsabilidade não só de ajudar minha equipe, mas também de deslocar com segurança, urgência e com cautela para que não haja danos. A responsabilidade é muito grande. A cada dia que fui aprendendo e chegando a essa experiência, mais me deu vontade de ajudar as pessoas.
Riscos com a Covid-19 durante o trabalho
- É algo inesperado. Estamos nos cuidando, colocando a máscara. A gente pede para as pessoas não se aglomerarem. Mesmo não estando na área de risco, a gente leva as pessoas para o hospital e não sabe o que vai encontrar no hospital. Ou se a pessoa que estamos atendendo tem alguma coisa.
Houve um acidente de moto que envolveu três pacientes, e um deles apresentou suspeita de coronavírus. Nem sabíamos disso porque estávamos num atendimento na autopista, mas estamos preparados para qualquer coisa.
O que é mais mais especial: fazer um gol ou salvar uma vida?
- São duas situações diferentes. Como ex-atleta, é você fazer um gol pelo clube que você ama. Outra é você salvar uma vida sabendo que outras pessoas estão esperando pela recuperação de um parente em casa. Conseguir fazer com que uma pessoa sobreviva é muito gratificante.
Chegada ao Vasco
- Eu vim de Barra Mansa para o juvenil do Vasco. Cheguei como volante, mas nos juniores começaram a ver que eu tinha boa impulsão, me botaram para trás para jogar como zagueiro central e cheguei ao profissional.
- O Nelsinho era o treinador do Vasco, e eu estava no banco. Eu ia entrar e voltei para o banco, parece que o Eduardo não queria sair (acabou expulso). Entrei (no lugar de Edmundo) e na segunda bola que peguei, dei dois ou três cortes, chutei e foi lá no ângulo. O rapaz deu um carrinho na frente, não sei se a bola bateu no bico da chuteira, mas bati de três dedos para tirar do goleiro.
Brasileiro de 1989, o primeiro título como profissional
- Foram títulos diferentes. Primeiro o Brasileiro na minha chegada no profissional, em 89. Foi o meu primeiro título. Eu era um atleta novo e estava chegando do interior, ser chamado pelo professor Nelsinho para ir pro profissional foi uma surpresa para mim. O Brasileiro foi um título muito importante para a minha carreira profissional.
Estreei como profissional no primeiro jogo do Roberto Dinamite contra o Vasco, quando ele estava na Portuguesa (em 21 de outubro de 1989). Foi muito difícil atuar contra o meu grande ídolo no futebol. Hoje, o Roberto é meu amigo.
Segundo relato da revista Placar (veja abaixo), Sidnei foi eleito o melhor em campo no empate por 0 a 0 contra a Lusa de Dinamite.
Placar: "Destaque dos juniores, fez sua estreia nos profissionais contra a Portuguesa e foi o melhor em campo. Exibiu ótima impulsão e bom domínio de bola". — Foto: Reprodução/Revista Placar
Tri carioca e quase ida para o Fluminense
- Depois veio a conquista do tri, e um dos títulos, o de 92, foi invicto. Foi o último do Roberto Dinamite com a gente no Vasco. No bicampeonato, o Vasco não queria renovar contrato comigo, com o William, o Jorge Luiz e o Alexandre Torres, se eu não me engano.
E o Carlos Alberto Torres, pai do nosso zagueiro, queria me levar para o Fluminense. Acabei renovando e fomos campeões contra o Fluminense em 93 e 94 (risos). Esse tipo de situação me surpreendeu.
Sidnei é o quinto (da esquerda para a direita) dentre os que estão em pé, entre Pimentel e Cássio — Foto: Arquivo Pessoal
Volta ao Vasco em outra função após pendurar as chuteiras
- Eu sou vascaíno, cheguei a trabalhar no Vasco como observador técnico da base e posteriormente do profissional. Também trabalhei como coordenador de avaliação.
Fazia 10 anos que o Vasco não ganhava título na base e conquistamos o Carioca. Conseguimos reunir alguns jogadores. O Vasco estava sem aproximação com os clubes pequenos e os grandes, que estavam muito distantes. Consegui fazer esse trabalho de aproximação e deu certo.
PRÓXIMOS PASSOS COMO SOCORRISTA
Encarar a faculdade enfermagem quando estiver com 50 anos
- Vou com todo o gás. Nunca é tarde para estudar, né? Estou entrando de cabeça nessa nova oportunidade na minha vida. Por gostar da profissão, provavelmente essa minha atitude de fazer curso de técnico em enfermagem e a faculdade com certeza vai engrandecer minha vida.
Apoio da família
- Minha esposa, Ana Luíza, está me ajudando muito. Tenho um filhinho agora de 7 meses, o Pedro. Tenho também o Gabriel, de 24 anos, que está terminando a faculdade de economia na UFRJ; e a Maria Luíza, de 20 anos, que vai fazer o Enem.
Créditos aos comandantes na nova função
- A gente tem um comando muito bom. Nosso supervisor de tráfego, que é o Ramon Bezerra da Silva, que é da Arteris, e o coordenador Adriano Vasconcellos. Também temos a Dona Léa Parreira, que é a diretora geral da São Francisco Resgaste (terceirizada à Arteris), e o nosso coordenador de frota, Felipe Torres.
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