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Dedicação de Dinamite em treino de faltas inspira jornailsta

Joaquim Ferreira dos Santos

Um dia eu marquei uma entrevista com o Roberto Dinamite após o treino do Vasco em São Januário. Quando os jogadores iam saindo de campo, eu entrei para me apresentar ao jogador e convocá-lo para o papo. Roberto tinha acabado de fazer aquele gol em que mata no peito, dá um chapéu no zagueiro dentro da área do Botafogo, e, antes que a bola quique no chão, enche o pé. Um dos momentos mais sublimes do futebol. Roberto me cumprimentou afável, mas pediu que eu esperasse mais um pouco. Ele ia treinar faltas. Durante uma hora eu vi Roberto Dinamite solitário treinando faltas de todas as posições em torno de uma área. Chutava por baixo, por cima, de trivela, de bico, de acordo com o lugar em que colocava a barreira de bonecos. Lembrei da história de um escritor em crise que vê pela janela, na pedreira em frente, o operário dando uma marretada, dez marretadas, no imenso pedregulho que só irá se desfazer lá pela 99amarretada — e ele sabe que a vitória chegou não pela força da última, mas pelo acúmulo de energia na série de marretadas. Eu vi Roberto Dinamite treinando faltas por uma hora. Acertava a curva, calibrava a força a se colocar nos pés. Aceitava com humildade que para colocar a bola ali onde a coruja dorme é preciso muita marretada e dedicação diária.

Desde então, em todo computador que abro, coloco a frase como descanso de tela: “Jornalismo é treinar cobrança de faltas”.

Fonte: O Globo