Futebol

Bismarck analisa final do Carioca e comenta amor pelo Vasco

A pedido do Extra, um jogador marcante na história do Vasco escreveu seu relato a respeito do triunfo vascaíno no Campeonato Estadual. Bismarck, ex-meia que apareceu para o futebol com a camisa cruz-maltina, foi tetracampeão estadual e campeão brasileiro pelo time de São Januário, mas neste domingo fez às vezes de colunista, para analisar a decisão contra o Botafogo.

Confira o texto de Bismarck, ídolo vascaíno no fim dos anos 1980 e começo dos anos 1990:

“Domingo, quando acordei, o primeiro sentimento que veio à minha cabeça foi o de nostalgia. Nostalgia da minha época de criança em São Gonçalo, quando meu pai falava no fim de semana comigo e com meu irmão, que iríamos ao Maracanã assistir a Vasco x Botafogo. Praticamente eu não dormia de ansiedade, esperando o domingo raiar para ter a felicidade de saber que, horas depois, estaríamos à caminho do Maracanã, com a Vasconçalo (torcida do Vasco em São Gonçalo naqueles tempos). Eu ia com o ingresso na mão e o coração na boca.

Pouquíssimas pessoas sabem, mas coube ao destino e à paixão do meu pai pelo Vasco, que eu não fosse jogador do Botafogo. Eu já jogava futsal pelo Vasco aos 10 anos e treinava uma vez por semana no Botafogo, no futebol de campo, no baixo de Campinho, em um campo chamado Rio-São Paulo. Era muito longe da minha casa, ficava a três horas e meia de ônibus. Depois, o treino se mudou para Marechal Hermes (antiga sede de futebol do Botafogo nos anos 70 e 80) e aí ficou impossível para mim, pois ficou mais longe ainda.

Lembro de dois jogos que nunca saíram da minha cabeça. O primeiro jogo, eu acho que todo vascaíno da minha idade não se esquece. Era um dia chuvoso, a partida estava 1 a 1, quando em um lance genial, Zanata jogou a bola para área do Botafogo, Roberto Dinamite matou no peito, deu um lençol no zagueiro do Botafogo e chutou no canto direito do goleiro do Botafogo, o Wendel, estufando as redes aos 42 minutos do segundo tempo, fazendo 2 a 1 para o Vasco.

Outro jogo goi a estreia do Carlos Alberto Pintinho no Vasco, vindo do Fluminense, volante que jogava de meias baixas, com extrema categoria. Ele fez um gol aos 42 minutos, no gol à direita das cabines de rádio, quando o Botafogo havia dominado praticamente o jogo todo. Aliás, existia uma certa superstição antigamente, que outros chamavam de escrita, que o Botafogo sempre jogava muito melhor do que o Vasco e sempre perdia na final. Acho que por isso que meu pai gostava tanto de ir a esses jogos entre Vasco e Botafogo. Apesar de que, jogando profissionalmente, o time na única final que perdi jogando pelo Vasco ironicamente foi o Botafogo, em 1990.

Deixando a nostalgia um pouco de lado e falando da atualidade, o Vasco x Botafogo de ontem. De um lado, o Botafogo tinha um treinador muito experiente e, na minha opinião, um dos melhores praa trabalhar com jovens, como é a equipe do Botafogo, que é o René Simões. Do outro, um treinador jovem, Doriva, mas que com seu jeito e personalidade, vindo no ano passado de um título paulista com uma equipe pequena, em pouco tempo deu ao Vasco uma cara e estilo, criou o time organizado na defesa para o ataque.

O primeiro tempo da final começou com o Botafogo melhor, mais focado e concentrado no jogo para reverter o placar da primeira partida. Logo no início o Botafogo teve duas chances, uma bem clara com o atacante Bill, que entrou sozinho em frente ao goleiro Martín Silva, em uma bola enfiada muito bem pelo meia-atacante Luis Ricardo e o goleiro do Vasco fez uma ótima defesa.

O vasco começou a equilibrar o jogo a partir dos 15 minutos. Doriva subiu a marcação do meio de campo e o Vasco começou a ter mais posse de bola, mas só levou perigo através das bolas paradas. O time tem dois zagueiros, Luan e Rodrigo, que são muito fortes nessas bolas. Luan, em uma jogada ensaiada, teve a chance de abrir o placar para o Vasco.

Já o árbitro quase se perdeu ainda no primeiro tempo, quando saiu distribuindo cartões amarelos um atrás do outro. De tanto subir a marcação, o Vasco, conseguiu seu gol em uma roubada de bola no campo do Botafogo. Quando apertaram a marcação em cima do volante Marcelo Mattos, Guiñazu, como meia, deu um lindo passe para Rafael Silva, que ficou frente a frente com o Renan. Ele deixou a bola quicar e fez um difícil e belo gol com a perna esquerda: Vasco 1 a 0.

O primeiro tempo terminou com o Vasco confiante e o Botafogo sentindo o gol em um erro fatal. O jogo foi muito disputado e corrido, porém longe de ter sido um bom jogo. Normal para uma decisão, que geralmente é uma partida nervosa. No segundo tempo, o sempre bom treinador René Simões tentou mexer na equipe, de forma que colocasse o Botafogo para buscar o empate e posteriormente a vitória. Ele tirou o Tomás que estava apagado na partida, colocando o Diego Jardel, para dar mais ritmo ao seu meio de campo e ao ataque. Ele já havia perdido seu melhor jogador no campeonato no primeiro tempo, William Arão, contundido.

O Botafogo passou a fazer uma certa pressão com as bolas altas na área do Vasco, sem muito suceso, sempre procurando o atacante Bill como ponto de referência. Rodrigo Pimpão estava melhor no jogo, pelo menos tentando algo a mais, porém o Vasco tinha uma defesa sólida. Como foi no campeonato inteiro, o Vasco se fechava todo e tentava os contra-ataques com Gilberto e Rafael Silva. René ainda tentou dar mais velocidade com a entrada de Sassá, mas o Botafogo não conseguia trocar muitos passes no campo do Vasco, até que seu lateral Gilberto, em uma jogada individual e pouco provável pelo meio, conseguiu achar um passe para Diego Jardel. Ele, com categoria, só tirou do goleiro vascaíno, fazendo 1 a 1 no placar.

Esse gol deu uma certa esperança à equipe do Botafogo e aos seus torcedores. O apoio da torcida colocou o Botafogo com um pouco mais de ousadia, mas desguarnecido na sua defesa. Doriva, com as substituições, até tentou ter mais a posse de bola para segurar mais o jogo até o final. Até que com a expulsão do volante Fernandes, aos 38 minutos, depois de falta em Serginho, jogou um balde de água fria nas pretensões alvinegras.

O gol de Gilberto no final veio coroar a equipe que soube aproveitar a vantagem da vitória no primeiro jogo da final, consolidando o título depois de 12 anos. A impressão que eu tenho é que tanto René Simões, no Botafogo, para a Série B, e Doriva, no Vasco, para o Brasileirão, terão que continuar trabalhando muito para que suas equipes cresçam e se firmem em dois campeonatos muito mais difíceis que o Estadual.

Como um apaixonado pelo futebl, torço para que o Botafogo volte à elite do futebol pela sua grandeza e história. Como um eterno vascaíno, torço para que meu Gigante da Colina volte a estar entre os grandes clubes brasileiros, de onde nunca deveria ter saído nos últimos tempo, por essa torcida tão apaixonada em todo Brasil. Eu me emociono ao falar do Vasco, pois passei da minha infância até a juventude dentro desse clube. A minha história e da minha família se entrelaçam e se misturam com a história do Vasco em uma história só. Casaca, casaca, casaca...”

Bismarck Barreto Faria

Fonte: Extra